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TRANSLÚCIDOS
(RAIMUNDO TRAJANO NETO)

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TRANSLÚCIDOS
O garotinho não se deu por vencido ante o primeiro “não”. Pediu de novo e, de novo, não. Por sua conta e risco incalculado, procurou uma brecha, um buraco no alambrado que cercava a piscina e passou para dentro. Muito movimento, ninguém lhe notara a presença. Ótimo. Assim, misturado às muitas outras crianças, poderia divertir-se mais, sem ser chamado à atenção. O pai, palhaço profissional, animava o clima na parte coberta do clube, a metros dali. Mesmo dizendo que era filho do artista do dia, não lhe fora permitido entrar para banhar-se na piscina.

Agora, que já estava lá, preparava-se para o seu primeiro salto. Seria um grande pulo. Cheio de ansiedade, o garoto jogou-se na piscina. Foi uma queda para o alto.

Enquanto o menino subia aos céus, seu pai, inocente, palhaço profissional, tornava a terra mais divertida para outras crianças e adultos.
* * *
Um palhaço confrontando-se com a dor real. Histórias assim já foram contadas e cantadas. Raimundo Trajano Neto transformou uma delas em poesia. Poesia onde amor e dor são rimas perfeitas, embora indesejadas. A diferença é que Trajano não apenas fez os versos — ele foi testemunha da tragédia.

Assim é o livro de Trajano. Aos instantes de pura imaginação somam-se duros momentos de vida.

Vividas, testemunhadas, desejadas ou intuídas... são muitas as vidas de um poeta. Razão a Victor Hugo: “Um poeta é um mundo encerrado num homem”. A poesia, à maneira de Ortega y Gasset, é o poeta e suas circunstâncias, suas vidas.
* * *
A poesia é o homem. Quem conhece o jeito de Raimundo Trajano Neto reconhecer-lhe-á sua poesia. Pois Trajano criou poemas à sua imagem e semelhança: simples. Nada de sofisticação vocabular, nenhuma elaboração frasal, nenhuma transgressão estética. Nenhum enigma, nenhuma Esfinge. Sem jogo de palavras, sem duplicidade de sentido. Simplicidade. (O crítico Roberto Alvim Corrêa sentenciou que “o simples é o contrário do fácil”). De qualquer forma, não foi a lei do menor esforço que levou Trajano Neto a cometer um soneto de versos decassílabos bem escandidos, além de alguns outros versos perfeitamente metrificados. Motivos para esse “tour de force” literário não lhe faltaram. O título do tradicional poema de 14 linhas é “Soneto para um grande amor” — e o que não se faz para, e por, um grande amor...).

Prévia e precavidamente, já o autor alertara, em suas “Palavras” iniciais, das suas intenções e dos seus limites. E o disse com sinceridade e bom humor. Sem o saber, quase cita Lawrence Durrel e sua definição de que “poetry is what happens when a anxiety meets a technique”.

Com sua estréia literária, Trajano completa a missão chinesa de colocar no mundo três seres distintos e necessários: um filho, uma árvore, um livro. E se houve “munição” para colocar no plural os dois primeiros, existe “material”, segundo ele, para não deixar o terceiro só. Portanto, mais dias menos dias poderá vir um segundo livro.
* * *
Amor e dor, vida e morte, indignação e esperança, família e solidão, Deus pai e Cristo filho, realidades e sonhos, recordações e prospecções, a cidade em que nasceu e a cidade em que mora... O poeta não precisa voar para fazer poesia. Basta olhar em volta — e dentro — de si. Os assuntos borbulham. Trajano, pedreiro-livre, em simbólica e filosófica linguagem, arquiteta um pequeno universo de poemas onde predica verdades arcanas que pratica. Na construção desses versos nem sempre usou régua ou esquadro, mas, no balanço do prumo, deu-lhes compasso e não esqueceu o nível. Ajuntados ao livro, esses poemas conversam e repassam segredos entre si. É uma cadeia de união formando uma união em cadeia.

“Os poetas são os legisladores não reconhecidos do mundo”. É Shelley, no século passado, fazendo a sua “Defesa da Poesia”. Se o poeta é um legislador não reconhecido, o que dizer de um legislador conhecido que se lança poeta? Sim, Raimundo Trajano é vereador; acostumou-se, assim, a escrever leis para serem cumpridas. Agora, vem ele ofertar letras para serem sentidas. Porque o legislador escreve para fora; o poeta, para dentro.

Seja bem-vindo, Trajano, ao mundo interior.
Edmilson Sanches



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