Reconciliação entre o homem e a natureza em MORTALIDADE E MORALIDADE
(Hans Jonas)
“Temos de trabalhar na ideia de um pacto de paz entre a mente e a natureza, para o bem do qual os humanos arrogantes devem renunciar a muito do que a força do hábito aparentemente os autorizou. Em complemento, deve ser acrescentado o esforço filosófico propriamente dito, de modo a prover uma base tão racional quanto possível para o imperativo de responsabilidade, dentro de uma ontologia compreensiva e de modo a tornar este imperativo tão absolutamente convincente quanto o enigma da criação o permitir.” A mente de que fala Jonas é o ser humano, na sua plena expressão, numa linguagem elucidada de consciência de si como organismo vivo, entre os demais que habitam o planeta.
A teoria da continuidade jonasiana implica um respeito pelo que o homem foi, é e deverá vir a ser: um ser humano com potencialidades mentais além dos animais, mesmo aqueles que hoje já se considera serem dotados de moralidades. O facto de o poder do homem ser tremendo, do ponto de vista tecnológico, não significa de modo nenhum que as necessidades elementares de todos os seres vivos, homem incluso, estejam satisfeitas e, quando tal, garantidas. Pelo contrário, até.
Ao distanciar-se da natureza como mente privilegiada, o homem perdeu o conhecimento mais importante e benéfico que existe: o conhecimento por contacto (utilizando a linguagem da lógica, a que Jonas não se escusa de recorrer, na sua linha de raciocínio). Jonas pretende demonstrar, neste primeiro capítulo de Mortality and Morality , que o homem não é um estrangeiro na sua própria casa, mas um dos habitantes de uma comunidade de seres naturais. A sua qualidade excedente, a cultura, deverá ser um item de integração e convívio com a natureza e não um factor de instabilidade, insegurança e risco incontrolado.
Podemos agora perguntar: esta ideia da reconciliação é puramente interesseira? Será de um pacto momentâneo de conveniência que se trata? A resposta só pode ser um claro não, dadas as premissas e o raciocínio expostos. É que, ao ser reconhecido o valor intrínseco da vida, desde o primeiro sopro, Jonas está a impor-nos uma máxima de respeito pela vida, em todas as suas formas.
E é esta máxima de respeito que está na base de uma filosofia da responsabilidade nas acções, todos os dias, em qualquer momento das nossas vidas, a partir de …. desde ontem, já que o ser humano não é uma entidade estanque, mas um produto histórico/natural, desde a emancipação da forma sobre a matéria. Jonas diz-nos que a história não é puramente cultural, mas também natural. O homem (enquanto mente) é responsável pelos danos que tem causado à natureza e pela ousadia ignorante com que todos os dias afronta o futuro, como se garantido estivesse.
Jonas admirava os pensadores neoplatónicos, fundadores de filosofias de respeito pela natureza. Entre eles contava-se Epicuro, que já nos ensinava uma ética do bom senso: “Lembremo-nos, além disso, que o futuro não é completamente nosso, nem completamente não nosso, de modo a não o esperarmos como devendo necessariamente existir e a não desesperar como se devesse absolutamente não existir”.
A natureza, aristotelicamente falando, é boa em si mesma. Ao propor um pacto de paz com a natureza, Jonas pretende recuperar esta bondade intrínseca de todos os seres vivos.
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