A Terra sob o domínio da Lua
(Thereza Venturoli)
Em todas as culturas, a Lua sempre foi ligada à vida e à morte Faz 25 anos que o homem pisou na Lua pela primeira vez. Já realizamos dezenas de vôos tripulados e não tripulados até lá. Físicos, biólogos e botânicos estudaram mais de 400 quilos de amostras lunares, trazidas pelas naves Apolo. Mesmo antes da era das viagens espaciais, o homem já tinha bons conhecimentos do satélite da Terra. Sabe-se, por exemplo, que ele é composto de elementos bastante comuns aos terráqueos, como alumínio, silício e cálcio. A ciência garante que a Lua não passa de uma esfera poeirenta e esburacada. Apesar de tudo, ela continua sendo vista como uma entidade mágica, que tem poderes sobre os destinos da humanidade. Por quê? É difícil dizer. Parte da resposta pode estar na História. Misteriosa como a loucura, trazia fartura ou miséria "A Lua acompanha a imaginação do homem desde as primeiras civilizações", diz Niomar de Souza Pereira, diretora do Museu de Folclore de São Paulo. "Por não entender os fenômenos naturais, o homem buscava explicações nos astros, principalmente na Lua e no Sol. Daí surgiram os primeiros deuses e mitos." A lista é longa. A começar pelos gregos que, não contentes com uma única deusa lunar, criaram três: Ártemis, para o Quarto Crescente, Selene, para a Lua Cheia, e Hécate, para as luas Nova e Minguante. Os romanos foram mais modestos: chamavam a Lua de Diana, protetora da caça e da noite. Entre os povos da Mesopotâmia, ela era a deusa Sin, que mais tarde foi substituída por Ishtar, na Babilônia. Para os chineses, era Kwan-Yin e, para os índios brasileiros, Cairê ou Jaci. Shiva, um dos principais deuses do hinduísmo, chamado "Deus com a Lua nos Cabelos", era ao mesmo tempo o destruídor e o restaurador A Lua também foi adorada como um deus andrógino, que reúne características masculinas e femininas – como Shiva, o deus transformador do hinduísmo, que carrega a Lua Crescente como um de seus símbolos. Temperamental, instável e misterioso como a loucura, o satélite podia trazer fartura e saúde, ou miséria e doenças. Suas fases - Nova, Crescente, Cheia e Minguante - ajudaram decisivamente para essa reputação. Para os antigos, o próprio astro parecia nascer, crescer, atingir a plenitude e desaparecer, como a barriga de uma gestante. Por isso, ela foi associada à fertilidade da terra, dos animais e das mulheres. Era a senhora absoluta dos ritmos de vida e morte. Essa marca aparece na cultura de muitos povos, mesmo naquelas em que a Lua não adquiriu uma personalidade divina. No Corão dos árabes, ela é Qatar, símbolo do poder transformador de Alá. Entre os judeus, seu aspecto mutante transformou-a na representação do judeu nômade. Na Idade Média, os alquimistas a usavam para simbolizar o mercúrio, elemento fundamental do corpo humano. Até a Igreja Católica mantinha então um pé nos cultos lunares: aconselhava os fiéis a esperar a benéfica Lua Crescente para se casar ou mudar de casa. Ainda hoje, a imagem da Imaculada Conceição mostra a santa pisando uma Lua Crescente, que indica ressurreição e renovação. A imagem tem um segundo sentido: o do cristianismo vencendo o islamismo, cujo símbolo é exatamente o Crescente. O próprio São Jorge tem um "ancestral mitológico" numa antiga lenda oriental, da época do conquistador mongol Gengis Khan (século XIII), que falava de um guerreiro que combatia sem parar o dragão que vive na Lua. Na alquimia, a Lua era o símbolo do mercúrio, o Sol o símbolo do enxofre: dois elementos considerados básicos do corpo humano Ela também compõe o cenário para personagens fantásticos como o lobisomem: Segundo a pesquisadora de cultura popular Maria do Rosário Tavares de Lima, o primeiro registro desse mito está no livro Metamorfoses, do poeta latino Ovídio (43 a.C.-17 d.C.). "Com pequenas variações de um povo para outro, a história do homem condenado a se transformar em lobo e correr toda noite sete cidades à caça de carne humana existe no mundo inteiro", diz ela. "É a maior analogia para as mudanças vividas na Terra" Além do misticismo, o homem tirou da Lua também instrumentos para o lado prático da vida: devido a seu rápido e pontual ciclo de 28 dias, ela foi a primeira referência para a medição do tempo. Até hoje, as agendas trazem a marca dos primitivos calendários lunares: o "sábado" e o "sabá" dos judeus tiveram origem nos cultos lunares: entre os babilônios, "sabattu" era o dia de Lua Cheia, quando a deusa Ishtar ficava menstruada e, indisposta, precisava se recolher. Todos deviam, então, aproveitar o dia para "descansar o coração". Não são só as folhinhas que mantêm os sinais da importância que a Lua tinha para os povos antigos. Existe mais uma infinidade de palavras, em todas as línguas, surgidas dos tempos em que a deusa prateada dominava os céus. "Mente" e "mania" surgiram do termo "manas", ou "men", que, em antigos idiomas indo-europeus, designava o "sangue da sabedoria" da Grande Mãe, que surgia nas mulheres a cada mês, governado pela Lua - ou seja, a menstruação. São Jorge não é o único guerreiro da Lua. Antigas lendas orientais já contavam a história do Homem-Lua em eterno combate com o Dragão Essa herança lunar é universal - está presente em todas as culturas, com diferentes interpretações. Na astrologia, tudo o que tem forma e é mutável é regido pela Lua. "Não é ela que causa, fisicamente, as transformações", comenta o astrólogo Oscar Quiroga. "A Lua é apenas a maior analogia que o homem encontrou no Cosmo para as mudanças vividas na Terra." Assim, o fascínio da Lua resiste, ao longo dos séculos. Ainda hoje, dizem que ela influi na germinação e no desenvolvimento dos vegetais, no crescimento do cabelo, no humor das pessoas, na gestação e no parto, entre outras coisas. A ciência não consegue eliminar de vez esse encanto lunar. Mas faz um contraponto com as crenças, limitando os territórios do conhecimento e da mitologia. Nas próximas páginas, você vai saber o que há de verdade e de superstição em tudo isso. A força física sobre a Terra e a água Além de causar as marés oceânicas, a gravidade do satélite tensiona a crosta terrestre e altera sutilmente a pressão atmosférica. "Lua a pino, maré do destino" (Dito popular entre os pescadores) Mauró Aparecido Lázaro nasceu e passou todos os seus 46 anos de vida na fazenda da Faculdade de Zootecnia da Universidade de São Paulo (USP), em Pirassununga. Hoje, é o responsável pela administração de todas as atividades agrícolas da fazenda. É com essa autoridade que ele garante: "Madeira, para ser de boa qualidade, tem de ser cortada na Lua Minguante, porque nessa época 'chupa' menos água do solo. Nas outras luas, ela se encharca e o mourão logo apodrece." Nas mãos do agricultor, as plantações da fazenda da USP, que fornecem alimento aos rebanhos da escola, seguem um rígido cronograma lunar. Arroz só deve ser plantado na Lua Nova de outubro. Alho, para durar mais tempo, tem de ser colhido na Minguante. "Se existe alguma prova científica disso, eu não sei", admite Lázaro. "O que eu sei é que a gente segue essas regras desde o tempo do meu avô e nunca deu errado." Assim, mesmo não se comprometendo com a influência da Lua sobre as plantas, os agrônomos da USP de Pirassununga acabam respeitando a "administração lunar" de Mauro. Não é só no interior do Brasil que a Lua é usada tradicionalmente como indicador agrícola. Há mais de quarenta anos, a técnica alemã Maria Thun desenvolveu um calendário de plantio e colheita que leva em conta as mudanças de posição entre a Terra, a Lua e os planetas. Segundo o agrônomo René Piamonte, do Instituto Biodinâmico, em Botucatu, Estado de São Paulo, não se trata de astrologia. "Mas não tem como negar que a conjunção dos astros, em particular da Lua, influi no crescimento dos vegetais." Provas científicas? Ninguém tem. Mesmo Piamonte se rende: jamais conseguiu concluir uma experiência que comprove a eficácia do sistema lunar. Existe gente que precisa ver para crer.
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