A Terra sob o domínio da Lua (cont.)
(Thereza Venturoli)
Existe gente que precisa ver para crer. O agrônomo Salim Simão, professor aposentado da USP, é uma dessas pessoas. Intrigado com as histórias que ouvia na faculdade sobre a influência da Lua na lavoura, ele resolveu fazer desse assunto o tema de sua tese de doutorado, em 1946. Durante cinco anos, Simão semeou vários tipos de hortaliças, em todas as fases lunares. "A acreditar no que os lavradores dizem, os vegetais de folhas, como alface, repolho e espinafre, deveriam se desenvolver melhor se fossem plantados na Lua Cheia", conta ele. "Os de bulbo, como cebola, cenoura e rabanete, na Lua Minguante." Mas não foi isso que Simão verificou. As hortaliças parecem só dar bola mesmo para o clima. "A cenoura e o rabanete vão muito melhor durante o verão, não importando a fase da Lua em que forem plantados." Quanto à influência da força gravitacional da Lua na germinação das sementes, Simão também fez as contas e nada achou. "O efeito da força de gravidade lunar - se é que existe - seria insignificante: não representaria mais do que 0,5 milímetro no crescimento de uma árvore de 20 metros de altura." Nem a maior ou menor absorção de água pelos vegetais resiste a uma análise mais detalhada. "A necessidade de água de uma planta depende do quanto ela transpira", esclarece o botânico Gilberto Barbante Kerbauy, professor de Fisiólogia Vegetal na USP. Ou seja, como qualquer organismo vivo, os vegetais buscam manter o equilíbrio. A quantidade de água absorvida do solo será tanto maior quanto maior for a perda de água pelas folhas. "E isso tem a ver com o clima, e não com a Lua", conclui Kerbauy. "A melhor pesca é no 'quebrante' da Lua Cheia" Mudando da terra para o mar: Emídio Balbino dos Santos passou a maior parte de seus 84 anos junto ao mar. Pescador na praia de Toque-Toque Pequeno, em São Sebastião, litoral norte de São Paulo, ele assegura: "Nos dois dias seguintes à Lua Cheia, que a gente chama de quebrante da Lua, a pesca rende mais." Há idéias que, de um jeito ou de outro, funcionam. Segundo o engenheiro de pesca Moisés Almeida de Oliveira, professor da Universidade Federal do Ceará, o pescador tem razão. - Oliveira explica que nas marés mais fortes, provocadas pelas luas Nova e Cheia, as águas sobem e descem com muita violência. Para quem faz pesca de espera, como seu Emídio, isso é ruim porque nesse caso a rede precisa ficar parada, o que não é possível nas águas turbulentas. Por isso, o melhor para ele são os dois dias depois da Lua Cheia, quando as correntes começam a se acalmar. "Para quem faz pesca de arrasto, por outro lado, puxando a rede de barco, as melhores marés são mesmo as mais fortes", diz Oliveira. Isso porque as correntes mais intensas revolvem o fundo do mar e trazem para a tona microorganismos, como os plânctons, que atraem atrás de si todo um cortejo de peixes - presas fáceis das redes em movimento. Assim, pode-se dizer que, ainda que indiretamente, a Lua tem, sim, influência sobre a pesca. Porque ela mexe com as marés. E, imagine: as marés podem decidir até guerras. A Segunda Guerra Mundial terminou como terminou por influência da Lua. O General Dwight Eisenhower só marcou a data de desembarque das forças aliadas na Normandia, na França, depois de consultar a Lua. Não se tratava de superstição, mas de simples questão de tática militar. A madrugada de 6 de junho de 1944 foi escolhida com base no estudo das marés no Canal da Mancha. Esta era uma das únicas noites claras, de maré baixa -- condições fundamentais para a chegada das tropas americanas e francesas à praia dominada pelos alemães. Assim, era possível aos aliados enxergar perfeitamente as armadilhas e a posição dos inimigos. As marés são o único efeito comprovado "Na verdade, a data inicialmente escolhida era o dia 5, mas o desembarque acabou sendo adiado por causa de uma violenta tempestade", comenta o astrônomo Ronaldo Rogério de Freitas Mourão, astrônomo do Museu de Astronomia, no Rio de Janeiro. Desse ponto de vista, não há, portanto, nenhuma inverdem afirmar que a Lua "define" os destinos da humanidade. "Mas é uma influência indireta, por meio das marés - estas, sim, o único efeito lunar cientificamente comprovado sobre o planeta", completa Mourão (veja quadro). Não são só os oceanos que sentem a atração gravitacional da Lua. Ela provoca também movimentos de atração e retração na porção sólida e gasosa do planeta, as chamadas marés de crosta e de atmosfera, bem mais sutis que as oceânicas. "A crosta, por ser sólida, oferece uma resistência muito maior e qualquer movimento aqui é praticamente imperceptível" explica o astrônomo. Os gases, que compõem a atmosfera, por outro lado, tendem a ocupar todo o espaço que lhes é oferecido. Assim, também aqui, o efeito que a maré produz na pressão atmosférica é mínimo. Marés também no corpo humano? "Bênção, dindinha Lua Me dá pão com farinha Pra tratar da minha gatinha Que está presa na cozinha" (Reza de crianças) Quando Janaína completou sete dias de vida, dona Joaquina, sua avó, deu o primeiro banho na criança e, assim que a Lua subiu, levou a menina para fora e estendeu-a para o alto, rezando: "Luar, luar, aqui está Janaína, me ajuda a criar". Hoje, Janaína é uma saudável garota de 13 anos. O quanto a bênção lunar influiu na boa criação da filha, o pai de Janaína, o pesquisador de cultura popular Toninho Macedo, não sabe dizer. "Mas pedir a bênção à Lua é costume na minha família desde que eu era criança", diz o folclorista fluminense, que hoje vive em São Paulo. A história de Janaína demonstra bem o fascínio que o satélite natural da Terra sempre exerceu sobre o homem. Um fascínio que mexe, inclusive, com todo 0 organismo humano - da gestação ao parto, do crescimento do cabelo à loucura. A Lua sempre foi fortemente associada à mulher. A começar pelo ciclo menstrual: o período regular, de 28 dias, é o mesmo tempo que o astro leva para cruzar o céu e passar pelas quatro fases. Daí, a crença de que ele controla toda a gestação e o próprio parto. E isso aparece até nas maternidades. A Neomater, em São Bernardo do Campo, município da Grande São Paulo, é um exemplo disso. "Apesar de não termos nenhum relatório oficial, podemos notar que boa parte dos 400 partos que fazemos por mês está concentrada nos períodos de mudança de Lua", comenta Walter Ramos, diretor clínico do hospital. A obstetra Neiva Ortiz de Camargo, que também é astróloga, diz que tudo depende do mapa astral de cada pessoa. "Mas, de maneira geral, na Lua Cheia há uma ocorrência maior de hemorragias e até abortos." A explicação mais comum para esses nefastos efeitos lunares são as chamadas "marés biológicas". Criada pelo psiquiatra americano Arnold Lieber. A teoria supõe que, se a Lua mexe com os oceanos, provocando as marés, mexeria também com os líquidos que constituem cerca de 7U% do organismo humano. Assim, se a Lua Cheia provoca marés mais violentas, deveria também provocar uma expansão no líquido amniótico, que envolve o embrião no útero, forçando a bolsa e precipitando o parto. A teoria é até bem bolada. Mas não consegue convencer a todos. "Cerca de 60% dos abortos são provocados por anomalias genéticas da mãe, como má-formação uterina", sustenta o ginecologista e obstetra Thomas Gollop, que diz desconhecer algum trabalho científico que comprove a influência - ou não-influência - da Lua sobre o organismo humano. O que há são levantamentos estatísticos. E, aí, quase sempre acontece um empate. "Se fosse assim, teríamos uma hemorragia por dia".
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