Amanhã, numa boa
(Faïza Guène)
Quem é essa menina de carinha de órfã sofrida, meio perdida no mundo, apagada na multidão? Ela que veio da cidade em chamas. Que poderia ser um dos jovens incendiários pondo fogo nos símbolos de status, de cidadania, de estar de bem com a vida. Ela se chama Faïza Guène e é a autora do romance “Amanhã, numa boa”. A francesinha que sabia que estava doendo, que era impossível viver sem explodir de revolta e botar fogo no mundo, mas que escolheu o caminho da arte, que liberta. Ela pelo menos foi libertada pela arte. A Faïza, a nossa francesinha, ela pelo menos poderá ter quase certeza de que terá o “Amanhã, numa boa”, como diz o título do livro dela. Chorava de alegria, uma alegria muito sofrida, muito doída. Ela que foi orientada por uma oficina de artes comunitária como os pequenos favelados. Poderia estar fumando e cheirando e injetando todas – e queimando todos os carros e prédios públicos que encontrasse pela frente – mas descobriu o caminho da arte, que liberta. Tinha só uns 14 anos quando uma professora leu umas páginas de uma história que ela estava escrevendo. Era o gérmen de “Amanhã, numa boa.” A professora descobriu que estava diante de uma artista. Ensinaram-lhe primeiro a fazer filmes – fez alguns curtas e um média-metragem, “Rien que des mots” (nada além de palavras).Depois terminou o romance, com 18 anos de idade apenas. É sucesso na França, nos Estados Unidos e na Inglaterra. Vendeu mais de 200 mil exemplares só na França. O livro e o filme têm o mesmo tipo de história: a vida de uma menina filha de imigrantes na França. Ela é francesa, os pais vieram da Argélia ou de outro lugar da África. São cidadãos de terceira classe. Desclassificados. A bela “Liberdade, Igualdade e Fraternidade” da França. Os imigrantes, ou filhos ou mesmo netos de imigrantes, vivem em ghetos, excluídos da sociedade. São mais escuros, têm roupas, costumes, religião, tradições diferentes. O bastante para serem excluídos. A maioria são muçulmanos, mas na França não existe liberdade religiosa – e, só pelo fato de ser muçulmano, você tomará uma cusparada de desprezo na cara. O livro de Faïza saiu na França pouco antes de começar a revolta dos jovens da periferia de Paris. É como uma revolta dos bárbaros. Os jovens que começaram a botar fogo em tudo porque nada tem sentido. Como se Faïza previsse o que iria acontecer. O que volta a acontecer, agora, um ano depois. Uma vida sem perspectivas. Se é normal o jovem ver-se desconcertado no mundo, imaginem um mundo que não o aceita. Ele é um pária, ele não é ninguém. Ele põe fogo no mundo. O livro de Faïza aponta uma saída: o humor, a arte. É um livro gostoso de ler, descontraído, divertido. Embora a dor escondida em cada sorriso, em cada piada, em cada boa solução que Faïza encontra para seus personagens.
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