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Feras de lugar nenhum
(Uzodinma Iweala)

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O menino Agu foi achado no meio do mato por um outro menino, apanhou como um bicho. Quando viu, estava transformado num soldado. O pai tinha dito para correr para bem longe, “assim o inimigo não mata você.” Mas quem é o inimigo? Agu não sabe o que está acontecendo. Já não tem pai nem mãe. Não sabe quem é o inimigo. Um menino como ele o encontrou e entregou ao “Comandante”, que lhe ofereceu uma alternativa: ser soldado ou morrer. De repente, transforma-se em soldado. Apanha, sofre, é judiado até às últimas conseqüências – menos morrer. Os sofrimentos que você puder imaginar, ele sofrerá.
O menino Agu poderia ser o jovem escritor Uzodinma Iweala, autor de “Feras de lugar nenhum”. Difícil acreditar que não sejam a mesma pessoa. Uzodinma conseguiu, diria, total identificação com seu personagem, vestiu a pele de Agu, tomou-lhe o sangue e o coração. Tornou-se Agu. É o teste de fogo para um escritor: tornar-se o seu personagem. Não é bem por isso que Flaubert falou “Madame Bovary c’est moi”. Mas é isso.
Ele não é Agu. Nasceu nos Estados Unidos, filho de nigerianos que o queriam médico. Quis escrever, freqüentou Harvard, preparou-se para mostrar ao mundo a dor de gente que não teve a mesma sorte que ele. Soube da existência de meninos-soldados em várias partes do mundo. “...dei o bote surdo da fera”, de “Uma Temporada no Inferno”, de Rimbaud, lhe deu o título do livro. É a única referência literária. Esses meninos podem ser da sua Nigéria ou de qualquer lugar do mundo. Pensei logo nos meninos-do-tráfico do Brasil. Meninos para quem tanto faz viver ou morrer. Matar ou... Ou talvez não haja outra escolha mesmo.
Uzodinma contou que o difícil foi encontrar o tom de voz de Agu. É a dificuldade de todo ficcionista, por mais experiente, no início de cada narrativa: o tom de voz. Como falaria um menino perdido na selva africana? Uzodinma tornou-se aquele menino sem pátria nem nada. É o menino desgraçado que ouvimos, quando lemos Uzodinma. Meninos-fera, irracionais como feras acuadas.
O grande escritor angolano radicado no Rio de Janeiro, José Eduardo Agualusa, apresenta-nos Uzodinma e seu mundo assustador que seria melhor não conhecer. É o horror latejando naquela narração cheia de cor e ritmo. Talvez o leitor não seja a mesma pessoa, diz Agualusa, ao ler a última frase do livro: “Sou todas essas coisas. Sou todas essas coisas, mas uma vez já tive uma mãe, e ela me amava.” Dói, fere a alma da gente.
Não estou dizendo que “Feras de lugar nenhum” seja um grande romance. Não é. O final é fraco, uma solução convencional. Mas dói, fere a alma, você não passa incólume por ele. Há um ritmo narrativo de uma força assombrosa, um crescendo de horrores levado com mãos de mestre, derrubando qualquer frieza de leitura. Você não consegue ler friamente esse livrinho. Não se impressione com as palavras que eu usei, “fraco”, “convencional”. Não as retiro, você não quer aqui a perfeição. Você foi derrubado por esse livro escrito com sangue. Esse menino estava gemendo e suando sangue nas palavras de Uzodinma.
Cuidado! As “Feras de lugar nenhum” podem ser do Brasil. Podem estar bem próximas de você. Podem matá-lo ou ser mortas por você. Este romance faz uma denúncia cruel: nós matamos, nós também podemos ser culpados do medo que sentimos, desse problema que não sabemos como resolver. Não, eu não sou eu mesmo depois desta leitura.



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