O Papa Bento no Brasil
(Cassiano Ribeiro Santos)
O PAPA BENTO NO BRASIL Naquele país era sempre noite. O céu, cravejado por milhares de estrelas, ao mesmo tempo em que incitava pensamentos transcendentes, enchia de opressão o peito dos homens pela vastidão das trevas que elas não conseguiam iluminar - eram até mesmo irmãs, pois como conceber estrelas sem o " fuscum subnigrum" das trevas? – Para espantar o temor, a cada vez que um homem bom morria, uma estrela era batizada com o nome dele e era cultuada como protetora, como intercessora divina e produtora de milagres. Havia no céu tantos santos e beatos que mal cabiam no exíguo calendário da ordem que administrava o arremedo de fé daquele povo infeliz. Uma velada engrenagem cuidava de destituir e canonizar os santos no mesmo e vagaroso ritmo em que os equinócios se deslocavam: Saía São Xisto, São Pacômio e São Ruberval; entrava Santa Carlota, Santa Inês e Santa Hermengarda. Havia também, no céu desta nação, a feminina lua, a mãe de toda a crença, e ela era chamada de Mãe de Deus! Sua vaga luz, seu brilho de aluguel, palia as trevas como um eco nas montanhas ferindo o silêncio de um vale; mas havia dias em que ela não brilhava e qualquer névoa mais encorpada bastava em encobrir as estrelas, o temor se espalhando pelos becos e palácios. Para iluminar as trevas e administrar as estrelas, os homens desta nação construíram um gigantesco farol chamado PAPA-gaio primeiro. Da sua extremidade brotava uma estroboscópica luz vermelha que fazia a terra parecer o interior de uma boate. Um dia, sem que dessem por isso, a terra girou e no horizonte rasgou-se o véu! Uma faixa de flamejante luz se ergueu. Em poucos instantes, a lua, as estrelas santas e a boate foram avassaladas pelo fulgor exclusivista do Deus-sol masculino e soberano, cujo nome é Jesus Cristo, o Leão da Tribo de Judá! Uma antiquiquíssima tradição européia, em vigor ainda hoje na Inglaterra, reza que o primogênito herda os títulos e todas as terras, o segundo filho comanda os exércitos e o terceiro, entrava para a igreja. O primogênito assim ficava com todas as riquezas; o segundo, não tendo o que herdar, assumia o exército e ia pilhar fora do reino o que não pode ter dentro do seu; o terceiro, não tendo herança nem meios para pilhar, entrava para a igreja e ia roubar os pobres! A Genealogia do Papado mostra que mais de uma centena de Papas eram terceiros ou quarto filhos da nobreza européia! _____________________________________________ Crispin Corcoran era mesmo um osso duro de roer. Tão logo retornara da guerra, com cicatrizes e galardões no peito pendurado, fora nomeado delegado da sua cidade natal. Transcorria os brejeiros anos cinqüenta e quase não havia muito e que fazer no recém emancipado vilarejo de Itambé: roubo de gado, agiotagem, bebedeiras e adultérios não comprovados compunham o repertório de ocorrências que bastavam aos seus dois auxiliares, Borjala e Farjala " chamar na catraca " para fazerem a simplória engrenagem do lugar voltar ao ritmo normal. Enquanto seus dois cupinchas faziam a ronda de bicicleta, Crispim desfilava em um Ford Landau preto e prata que sacolejava ao peso do porta-malas abarrotado de facões e pederneiras, espingardas e estrovengas, garruchas, bacamartes e cravinotes recolhidos em suas rondas pela feira e zona rural. Até mesmo fogos de artifício ele " güentava ", até o dia em que os fogos explodiram carbonizando o banco de trás, espalhando fagulhas e fumaça no límpido céu azul de um fim-de-tarde. Com o fim do sinistro arsenal, Corcoran procurou outros meios de intimidar a bandidagem. Nenhum episódio passava pela sua delegacia sem que ele não encontrasse uma solução: essa era a sua legenda e a base da sua autoridade. Seu método era simples. Tão logo uma ocorrência era registrada, ele rondava o local do crime e levantava os suspeitos, Deus sabe por quais critérios! Em seguida prendia dois deles e os interrogava. Sua argumentação era, invariavelmente, a mesma: - As investigações apontam você e seu cumpade assaltando o armazém da serraria! Crime desse tipo aqui, a pena é de quatro anos de prisão. Vou interrogar os dois, separadamente. Se ambos negarem o assalto, tenho que soltá-los pois não tenho provas; se os dois confessarem, divido a pena e cada um puxa dois anos; mas, se um confessar o crime, acusando formalmente o outro, eu solto o confessor por delação premiada e condeno o teimoso a quatro anos de cana, mais seis meses por obstrução da justiça! Independente de serem inocentes ou não, o bom-senso e a lógica manda que os dois não confessem nada, entretanto, na hora de um confiar no outro.... nunca houve um caso destes em que um acusado negasse a acusação quando o outro pudesse confessar e sair ileso, toda a culpa caindo sobre seus ombros. Era sempre cana dividida para os dois, quase sempre, diga-se de passagem, inocentes como dois anjinhos travessos. Aberta sobre a mesa do delegado Crispim, a Bíblia Sagrada, na exata página do meio, exibia a sentença que a sintetiza e que pesa sobre toda a espécie humana: " Triste do homem que confia em outro homem". Crispim Corcoran sabia disso. mais detalhes sobre a vida e morte de Crispim Corcoran, acesse os links abaixo: http://pt.shvoong.com/books/satire/701161-buracos-negros/ http://pt.shvoong.com/books/biography/796277-vingan%C3%A7a-dos-nazistas/
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