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Esquizofrenias do quotidiano
(Luciana Couto)

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A minha avó a partir dos vinte e tal anos, até morrer, foi catalogada como esquizofrenica pelos médicos que a assistiam. A característica mais visível e desconcertante (para os outros) era o facto de falar sozinha. Passava os dias naquelas conversas sobre o passado, o presente e algumas vezes o futuro. Era totalmente auto-suficiênte. Não precisava de mais ninguém para animar o seu monólogo. Porém para a família era um pouco constrangedor quando ela se punha a falar em público: nas lojas, restaurantes, etc. Toda gente ficava a olhar, disfarçadamente, mas a olhar e de uma certa forma a condenar a sua presença entre pessoas mentalmente sadia.
Hoje saio a rua e cada vez vejo mais pessoas a falarem sozinhas. Serão todas esquizofrenicas?! Descobri que ao falarem sozinhas dentro dos carros é um acto de maturidade e respeito pelas leis de segurança rodoviária, pois na verdade estão a falar ao telemóvel com outra pessoa, não sei onde, e que para usarem as duas mãos para conduzir utilizam os chamados "mãos livres". Fantástico! Já que não conseguem evitar de falar ao telefone, nem estacionar para poderem falar com ainda mais segurança. Parece que essses não são considerados esquizofrenicos como a minha avó.Há contudo, outra categoria de faladores (sozinhos) que descobri recentemente. Alguns andam pelas ruas a carregar sacolas e a falarem sozinhos, outros não carregam sacolas, mas também falam sozinhos enquanto caminham, outros sentam-se nas paragens de autocarro e falam sozinhos. Fui informada que não falam sozinhos, estão a falar com alguém através do telemóvel, mas que para facilitar ou porque está na moda, ou porque tem menos efeitos colaterais, utilizam uns auriculares muito giros (já existem em várias cores e formatos). Depois destas observações fiquei a pensar que o problema da minha avó foi viver antes do advento dos auriculares, mãos livres, seja lá como isto se chama. Hoje em dia ela poderia andar por todo lado a falar e falar sozinha e ninguém iria olhar com desconfiança, desde que estivesse, evidentemente, ostentando um auricular. E esta gente normal que fala e fala ao telefone móvel, com ou sem auricular, será assim tão normal? As queixas mais comuns que aparecem nas revistas e programas de televisão é que pais e filhos não falam uns com os outros, marido e mulher seguem o mesmo não discurso e aí eu me pergunto para que tipo de relacionamento humano estamos a nos encaminhar?Sem dúvida que algo diferente se está a passar no comportamento de homens e mulheres desta época. Não tenho certeza, porque normalmente não tenho certezas, mas questiono se o que se está a passar contribuirá para o isolamento cada vez maior dos sujeitos ou estará a normalizar o sentimento de solidão na multidão, ou simplesmente inaugura-se uma outra forma de viver, onde todos nós, cedo ou tarde, nos adaptaremos e qualificaremos esse novo modus vivendi como sendo o normal.



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