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As psicopatologias da alimentação quotidiana
(site de psicanálise)

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Vivemos uma época de forte exigência de perfeição de imagem. Novas figuras do corpo são construídas a partir dos cruzamentos entre narcisismo, sociedade do espetáculo, angústia, pânico, depressão, consumismo, sexo e morte. Essas questões vêm acossando o cotidiano da clínica psicanalítica. A pressão social por uma figura cada vez mais magra se converteu em uma espécie de tirania de valores. Deste modo os prazeres da mesa são hoje regados por sólido sentimento de culpa, e esse tempero, que passou a fazer parte do nosso cotidiano, do nosso "feijão com arroz", vem sendo acompanhado do crescimento alarmante de toda uma patologia do comportamento alimentar, quais sejam os quadros de bulimia, anorexia, obesidade, compulsão alimentar. Importante ressaltar que paralelamente a essa patologia passamos por um estágio de uma sexualidade pretensamente liberada, enquanto que, paralelamente, o sexo nunca foi tão estudado, codificado, medicado e exibido. A alimentação está diretamente ligada à biologia, mas não se limita a ela. Sabemos que a humanidade se alimenta de carnes, vegetais, frutas e de imaginário. Mas o simbólico, o onírico, os significantes, os mitos, os fantasmas, a sexualidade também compõem nossas refeições. No ato de nutrição o sujeito, o homem biológico e o homem social estão intrinsecamente misturados. Temos total liberdade para escolher o que, onde, como, e até com quem queremos comer. Mas será que exercemos esse direito de escolha em sua plenitude? Trata-se realmente de um tema transdisciplinar, um objeto de múltiplas entradas, onde os enfoques ditos especializados jamais revelarão "a verdade". Estendendo a abordagem à Antropologia, lembramos que a cozinha pode ser definida como um processo que simultaneamente une e afasta o mundo natural e o humano, posição tão primordial para a Antropologia quanto a proibição universal do incesto. Segundo Lévi-Strauss, ambas estão prefiguradas pela linguagem. "A palavra é o modelo de ambos, ponte entre o grito e o silêncio, a não significação da natureza e a insignificância dos homens" (Paz, 1977). Em seu estudo em que se conjugam 187 mitos Lévi-Strauss percebeu a presença de um tema comum, apesar de nunca explícito, qual seja a oposição entre o cru e o cozido, a natureza e a cultura. Melhor dizendo: em todos esses mitos a oposição entre a cultura e a natureza se expressa do mesmo modo como na criação humana por excelência, qual seja a cocção dos alimentos pelo fogo domesticado. Os símbolos se sucedem em sua contradição: o contínuo e o descontínuo, a vida breve e a imortalidade, a terra e o céu, o aberto e o fechado (as aberturas do corpo humano surgem convertidas em um sistema simbólico referente à ingestão e à dejeção), o canibalismo e o vegetarismo, o incesto e o parricídio, a caça e a agricultura e outros tantos. Lévi-Strauss observa que todos os mitos são metáforas culinárias, e enfatiza que a própria cozinha é, por sua vez, um mito, uma metáfora da cultura. Na realidade o sentido final de todas essas metáforas é a morte. Embora a necessidade de sobreviver pela alimentação e pela procriação seja comum a todos os seres vivos, os artifícios com que o homem enfrenta esta fatalidade o convertem em um ser único. Já Michel Foucault observou que a escolha de um alimento é, em sua estrutura, uma escolha existencial, pela qual se chega à constituição de si mesmo. A arte de comer seria a arte in fine. Em O uso dos prazeres, é possível encontrar uma descrição da dietética como algo equivalente a uma "arte sem museu". Trata-se de algo equivalente a uma lógica do corpo, ao mesmo tempo uma suposta defesa do poder. Segundo Foucault, "a prática do regime como arte de viver é (...) toda uma maneira de se constituir como um indivíduo que tem o cuidado justo, necessário e suficiente de seu corpo" (Foucault,1984). A dietética torna-se ciência da subjetividade, já que ética e estética se confundem. Deste modo pode existir uma ciência do particular que faz ponte com o universal, ou seja, ela é um meio indireto para a construção de si próprio. Onfray, ao tratar desta singularidade que ela autoriza, da auto-elaboração que ela permite, oportunamente, faz referência à conhecida reflexão de Brillat-Savarin apresentada em Fisiologia do gosto: "Diga-me o que comes, dir-te-ei quem és".



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