Tralhas Urbanas
(Teresa Oliveira)
" TRALHAS URBANAS "Enquanto você está no metrô ou no trem; no carro ou no ônibus; o que vê? No que pensa?. Percepção: Não sei dizer ao certo quando foi que me dei conta desta confusão e desconforto sobre o mundo que criamos, as cidades onde vivemos, a realidade que enfrentamos. No metrô, me senti assim, como se tudo estivesse congelado e eu, somente eu me mexia e podia perceber os outros. Em seguida, parece que tudo voltou ao normal e acordei com o aviso da parada: -“Próxima Estação... Sé. Acesso à linha 3, vermelha; desembarquem pelo lado esquerdo do trem.”. Quando as portas do trem do metrô se abrem naquele túnel quase de outro mundo, sai gente demais daqueles vagões e eu fico imaginando e me questionando: Por que? Levamos uma vida desconfortável, onde nós temos obrigação de nos adaptarmos, instruir nosso sono e cansaço para que vençam as dificuldades diárias e só relaxem se realmente estivermos na nossa cama, no nosso sofá. Mas, quando é possível? Às quatro horas da manhã, da varanda de minha casa, no escuro, já ouço passos apressados, de homens e mulheres em busca de seu sustento. Com ou sem chuva, estes passos descem a rua atribulados e é fácil perceber isso pelo jeito que andam, pelo som que emitem. Acaba sendo desumano ouvi-los assim, porque eu estou dentro de casa. Mas, quantas vezes na vida já fiz isso? Inúmeras foram as manhãs mal acordadas, em busca do horário a cumprir no trabalho. Quando se é jovem, acaba sendo uma grande conquista; mas na fase mais adulta, é um desapontamento, porque a pessoa sabe que muitos já não precisam correr atrás do dinheiro como ela e, antes dos 50 anos já estão mais estruturados. São tantas as diferenças entre um e outro que acaba mesmo sendo uma grande injustiça. E de novo, chego a mais uma etapa da minha maluca viagem, de ida ou de volta para casa, mas que em tempos ruins, me faz economizar dinheiro. -“Estação Palmeiras Barra Funda. Acesso à linha 3 vermelha do metrô, Ponte Orca e Rodoviária. Desembarquem pelo lado esquerdo do trem”. De 15 em 15 minutos, uma composição com 12 vagões de trens urbanos chega a São Paulo, proveniente de todas as cidades da Zona Oeste que teimam em grudar na Capital Paulista. São aproximadamente 2000 pessoas se acotovelando para subir apenas 2 escadas rolantes e 2 escadas comuns e atingir seus objetivos. Lá em cima, esta multidão se soma a outra, que faz o sentido oposto ou se dirige a outras localidades. É tanta gente que não exagero dizer que se acotovelam para passar. Uma maioria segue para o metrô e vai para a Zona Leste e Centro, tanto que, da mesma forma que o metrô superlota na Sé, esvazia na São Bento. Caras e bocas de todos os tipos, de todas as raças e condições financeiras. Ali a gente percebe mesmo que somos todos iguais nas nossas diferenças físicas, porque se algo acontecer, uma bomba explodir, estaremos no mesmo lugar e situação. Por isso eu pergunto: para que? A vida urbana é um caos que parece ter somente o objetivo de incomodar muitos para que poucos tenham paz. O homem errou na mão enquanto criava as atividades de cada um, porque sempre alguém mora onde não trabalha; alguém tem tudo para vencer na vida e não deslancha; alguma família precisa de um médico e não tem plano de saúde; um aleijado necessita de uma cadeira de rodas e não pode comprar. Há muitos nãos neste mundo e isto vai inconformando, desiludindo nosso coração e quando percebemos fazemos parte daquele imenso grupo que está depressivo, passivo, incauto até, porque deste estado para a agressividade, não faltam muitos metros. Tudo vai se complicando, se fechando, nos apertando. É como diz o ditado: “Me apertou sem me abraçar.” Quem precisa ir para a rua todos os dias, ganhar seu sustento, está indefeso a todas as atrocidades da vida e acaba tendo que dividir seu espaço, seu ar, com cachorros abandonados, gatos mortos, mendigos, bêbados, ladrões, crianças exploradas por pais que as colocam dentro dos vagões dos trens para vender de um tudo, fanáticos gritando no seu ouvido a vinda de Jesus, o final dos tempos e te acusando de pecador. Ora, pecador! Logo eu, que acordei às 4 horas da manhã para ir trabalhar e volto agora, às 4 da tarde, cansado, esbudegado ? Que pecado cometi? Mas é exatamente assim que as idéias são colocadas para dentro de nossas vidas: com culpas. Parece que, desta forma, nos intimidam a agir como acham ser o certo, porque eu ainda me pergunto, na altura desta minha vida, o que é, efetivamente, errado, fora matar e roubar. Não sei. É, eu não sei, mas muita gente acha que sabe e olha para os outros de cima para baixo, como se fôssemos insetos indefesos, prontos para sermos pisados por sapatos enormes. A vida urbana criou muitos fantasmas e quando você anda pelas ruas pode reparar isso sem falsear. O mundo está repleto de chapados disfarçados de pessoas boas, cidadãs mesmo. De repente, pelo noticiário da TV você acaba se surpreendendo com as canalhices que aquele “terno senhor” cometeu. Acho que aí está o final dos tempos: na loucura de cada um de nós, quando não agüentamos mais nossas fraquezas ou defeitos; quando não cabem mais no armário os nossos segredos e eles começam a escapar do controle; quando olhar para o outro se torna um sacrifício indisfarçável; quando o silêncio e a solidão começam a ser nossos melhores amigos. Assim, deste jeito, vamos deixando transparecer o maluco que estava escondido na gaveta, até que, num belo dia, decidimos soltá-lo de vez e escancaramos. Por isso, quando me deparo com as belezas arquitetônicas de nosso mundo tão concreto, fico triste e praticamente ensurdeço nesta infelicidade, me colocando cada vez mais para dentro e me perguntando: pra que? Não fui feita para tudo isso, porque seria absurdo supor este poder. Portanto, não me ambiento a um mundo que varre as sujeiras para debaixo de seus tapetes e sai à rua com a maior cara de pau, como se tudo estivesse no lugar, bem certinho e vivêssemos num planeta que está para o bem, é do bem, ninguém morre em guerras, conflitos ou por fome. Se eu pudesse, de verdade, acreditar que ainda pensamos, mesmo que por segundos, no bem, sentiria minha alma totalmente livre para admirar e participar deste universo que criamos para nos servir e que vem há séculos, se servindo de nós. Acho que quem escreve vive com alma perturbada. Meu amigo há um buraco muito mais negro do que foi imaginado; há um cheiro de podre, de azedo até, nesta vidinha medíocre que bajulamos tanto. Porque bem e bom seria, se todos, igualmente, pudessem dispor de benefícios e funções. As diferenças nos aniquilam no mais íntimo, mesmo que haja uma tendência muito forte de negá-las. Reparem que dificilmente dinheiro e amor caminham abraçados. Ou se tem um ou outro. Ou nenhum deles. Os dois, dando certinho, é raridade. Eu já tive dinheiro e amor ao mesmo tempo e vejam: quando o dinheiro se foi por incompatibilidade de gênio comigo, o amor saiu de fininho, na maior e, quando percebi, nada mais existia. O que ficou foi uma poeira da imensidão de um dia, que eu não divido nem com a saudade, por medo de perder a única linha que me prende a ele. Então, como podemos, de vez, dar um basta às nossas tralhas? Faxinando tudo! É isso mesmo! Limpando, esfregando até cansar e desejando que o brilho volte ao seu lugar de origem, porque não devemos mudar o sol de lugar, mas aprender com a sua luz. Que os subterrâneos dos trens do metrô nos levem por caminhos mais humanos. E isso se consegue com atitudes simples até. Se você sentou-se no lugar reservado, o de cor cinza, sabe? Levante-se e deixe-o para quem de direito. Se por acaso a impaciência de um colega de trabalho irrita-o facilmente, conte até dez e dê o desconto. Mas... E se o fanático acusar você de novo de infiel e pecador? Ouça-o somente, porque alguma palavra, com certeza, fará bem ao seu coração, já que ele acredita no que diz e diz de peito aberto, afin
Resumos Relacionados
- O Término De Tudo.
- Ma Engenharia E Mau Governo!
- Desemprego
- Não é Ser Românico, é Apenas Ser Humano
- Poema
|
|