Sardinhas do Báltico
(Fernando Sabino)
João entrou num botequim, pediu cerveja e sanduíche de sardinha. De repente, apareceu José, considerado o prêmio Nobel da mitomania, o rei dos mentirosos. João já tinha ouvido de José as estórias mais incríveis: sobre uma carta de Hemingway que José tinha recebido, sua íntima amizade com Chaplin, a longa viagem que fizera de jangada, sua atuação no passado, como integrante da Seleção Brasileira de Futebol e por aí a fora. João tinha certeza, enfim, de que José era o maior mentiroso que já pisara sobre a face da terra... e isso o irritava profundamente.
Aproximando-se de João, José já começou com uma das suas: “Não sei como você tem coragem de comer sardinha brasileira”. João tentou se defender, dizendo que era sardinha portuguesa, mas José afirmou que dava na mesma. Sardinha boa mesmo só a do Báltico. A melhor do mundo! Na casa dele, só entrava sardinha desse tipo. “E onde é que se compra essa tal sardinha do Báltico?”, perguntou João. O outro disse que em lugar nenhum. Só no Báltico mesmo. Só que ele tinha seus macetes, mandava importar diretamente.
Os olhos de João brilharam. Tinha chegado o momento que ele tanto esperara. Finalmente, desmascararia o amigo mentiroso. Disse que queria experimentar a tal sardinha, e era naquele exato momento. José vacilou, tentou se desvencilhar. Disse que a mulher já estava dormindo. Mas João insistiu: “É agora ou nunca. Não sei por que, me deu uma vontade desgraçada de comer sardinha do Báltico.”
José não teve como escapar: “Se você insiste...” Saíram juntos. José caminhava duro, decidido a ir até o fim. João já antecipava o gosto da vitória. Finalmente desmascararia o maior mentiroso do Rio de Janeiro, talvez do mundo!
“Espere um instante que minha mulher é que sabe onde estão”, disse José. Foi lá dentro. Via-se que estava sem jeito, completamente encafifado. Mas em pouco voltava, carregando uma pilha de latas. Desculpou-se pela mulher que não ia aparecer, pois já estava deitada.
João, atordoado, examinou a lataria. Teve que render-se à evidência: eram latas de sardinha, não havia dúvida. E todas do Báltico.
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