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O Sol de Ontem
(Vicente da Silva Junior)

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O sol jamais havia nascido com “brilho” igual ao daquela manhã. Parecia tentar antecipar o acontecimento por mim tão sonhado. Cheguei primeiro ao tradicional local dos nossos encontros, mas em pouco tempo a grande e animada turma estava novamente reunida para mais um fim de semana na estrada. E eis que em meio às gargalhadas múltiplas, abraços, beijos, frases cômicas e ronco dos motores; alguém se aproximou em silêncio, abraçou-me por trás e sussurrou carinhosamente ao meu ouvido: “Não faz sentido seguirmos caminhos diferentes... Eu vou com você... Preciso de você!”. O tom inconfundível da delicada voz em segundos reviveu meus antigos e persistentes sentimentos. Virei-me ansioso por confirmar a surpresa e constatei o motivo do repentino disparar do meu coração: de fato era “ela”... Também pronta, com sua mochila nas costas. Igual aos “velhos tempos”. Eu a abracei como nunca e quase fui traído pelos meus joelhos, que fraquejaram diante da emoção. Mas, o som forte de uma chuva torrencial me trouxe de volta à realidade. Acordei assustado com as paredes do quarto tentando esmagar minhas ilusões. Me debati um pouco na cama com uma confusão de sensações digladiando no peito. A felicidade pelo sonho maravilhoso... O desapontamento pela interrupção... E a invencível tristeza por despertar e vê-la desaparecer entre as sombras... Levantei e fui até a área. A grande moto lá estacionada me fez reviver um trecho do delicioso sonho. Mas faltava a personagem principal. A única pessoa que, em silêncio e distante, me ensinou tudo sobre a dor do arrependimento.Apesar do tempo chuvoso resolvi rodar um pouco, movido por uma forte necessidade de tentar perdoar a mim mesmo. Mas, em poucos minutos as gotas de chuva se entrelaçaram às lágrimas, transformando meu rosto em um ponto de encontro entre a natureza e a alma. Eu há muito não era mais dono único dos meus próprios sentimentos. Voltar a sonhar com algo que já se teve, pode nos dar forças para reconquistar. Porém, voltar a sonhar com “alguém” que já tivemos ao lado e, por motivos absurdos, ferimos mortalmente, pode causar uma horrível sensação de incapacidade para amar. E era esse o pesado fardo que eu havia me auto condenado a carregar. Não conseguia aceitar o fato de acordar tão feliz por um simples “sonho”, com alguém que fora minha companhia real por tanto tempo. Por tanto tempo ali, e eu nem percebi... O amor é simples e não requer muito além da sinceridade nas palavras e atos. Mas eu havia me tornado expert na arte de complicá-lo enquanto estive com “ela”, e com isso assassinei sua essência. Eu a perdera, e muitos segundos dos meus minutos passaram a ser dedicados a remediar isso. Ou, no mínimo, entender. Frases feitas não satisfaziam minha necessidade extrema de entender o porque fui um estranho para eu mesmo, em tantas ocasiões. “Voltar a algo só depois que se perde”, me soava como óbvio. “Pessoa certa na hora errada” feria como fogo, pois “ela” era a pessoa certa, na hora certa e no lugar certo! Mas essa convicção jamais foi algo além de um projeto do meu coração. Eu nunca a presenteei com tais palavras, tampouco agi de forma a convencê-la disso. Por algum motivo inexplicável minha boca e meus braços pareciam desobedecer aos comandos de carinho. E, a arrasadora união entre o silêncio e o comodismo, me conduziu aos dias onde viver e sobreviver passaram a ter o mesmo sentido. Continuei a pilotar na chuva e sozinho por uma estrada deserta. Porém, por mais que eu corresse, os fantasmas não desapareciam dos retrovisores. Rodei muito, acreditando que a velocidade pudesse acelerar o tempo e ajudar na cura. Outra triste ilusão, pois o tempo passava e não respeitava minhas tentativas de esquecer. E eu ali, já não mais dono único dos meus sentimentos, buscando inutilmente na potência de um motor, uma forma de escapar do passado. Esse foi somente mais um dos muitos dias que sobrevivi inconformado com as migalhas dos meus próprios sonhos reciclados. E a certeza de um amanhã que nunca chegaria, consumia antecipadamente o hoje. Eu sabia que tinha aprendido a amar, que tinha aprendido a descomplicar esse sentimento único; mas... tarde demais. Por isso minhas insistentes tentativas de mostrar a “ela” tais lições tiveram o mesmo efeito de gritos desesperados de um náufrago, sozinho em alto mar. Dizem que Deus nos dá muitas oportunidades durante a vida, mas no amor o tempo pode se tornar um impiedoso inimigo. Principalmente quando aliado à distância. Essa união pode afastar para sempre. Portanto, quem ama deve agir agora! Quem ama não deve esperar o amanhã para condenar a boca pelo não dito, e os braços pelo não feito. Minhas eternas cicatrizes... Voltei para casa encharcado, por fora e por dentro, novamente trazendo na garupa somente a saudade. Saudade daquelas mãos que agarravam minha cintura, em tentativas quase desesperadas de diminuir a distância que aumentava; e eu não enxergava. Ao fim da tarde a chuva cessou e o sol se mostrou por alguns minutos. E em seus raios eu li a mensagem por mim mesmo escrita: existem fatos na vida que afrontam e vencem nossa capacidade de superação. Se tornam ironias do destino. E neste dia percebi que, por mais que eu ainda viva, nenhum brilho jamais será tão intenso quanto ao do... "inesquecível sol de ontem."



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