Os benefícios da dúvida
(; David; Pontes)
Os benefícios da dúvida: Os últimos momentos em torno da questão da Ota são invulgares e representam sinais positivos que importa fixar. É o país que tem a ganhar com a discussão que se segue. Era evidente que, do presidente da República à opinião publicada, as dúvidas eram tantas que algo tinha de ser feito para que a solução escolhida surgisse como alguma coisa mais do que uma teimosia. A necessidade de defender o dispendioso investimento num novo aeroporto (batalha que o Governo ganhou claramente) acabou por contaminar a discussão sobre a sua localização. Para defender as convicções do Governo e, muito especialmente, do ministro Mário Lino, apresentaram-se estudos e projecções que ou eram incompletos, ou partiam de premissas viciadas. A discussão deixou ainda claro que vivemos num país em que o ordenamento do território e as opções estratégicas não passam de expressões burocráticas, praticamente vazias de conteúdo. Mas, mesmo perante este cenário, manda a lógica nacional que este Governo, como outros no passado, resolvesse tudo com a política do facto consumado. Mandava-se construir e da discussão ficavam uns ecos distantes. O tempo de escassez de recursos é, no entanto, de molde a hesitações. E, enquanto o Governo hesitava, cresceu o movimento de opinião desfavorável à Ota. A ele somou-se uma inédita intervenção de empresários ligados à CIP e a vontade de Cavaco Silva de exercer o mandato para que foi eleito. Funcionou a sociedade civil, funcionou a democracia e, ao remeter a decisão para um estudo comparado das melhores alternativas, o Governo mostrou estar à altura do desafio. Com algum cinismo, podemos dizer que isto não vai adiantar nada, que está tudo decidido. Acho que não, e acho sempre bom quando um Governo tira tempo para pensar, para ponderar as dúvidas do país. Quem sabe? Até pode ser que aproveitem para melhor analisar as consequências para o aeroporto Sá Carneiro... E, daí, talvez seja pedir de mais.
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