Breve história da anestesia geral - Parte 2
(medstudents)
Foi em um desses espetáculos de inalação de gás hilariante que Horace Wells, dentista na cidade de Hartford, tomou conhecimento da propriedade do NO2 de causar insensibilidade. Teve, então, a idéia de utilizá-lo em extrações dentárias. Fez uma experiência em si mesmo, solicitando a um seu colega que lhe extraísse um dente após inalação do NO2. Não somente não sentiu dor, como experimentou uma sensação de euforia e bem-estar. Entusiasmado, dirigiu-se à Boston, onde conseguiu permissão para fazer uma demonstração perante professores e estudantes da Faculdade de Medicina de Harvard. Um estudante se ofereceu como cobaia e a demonstração foi um fracasso. O estudante gritou de dor e Wells foi posto para fora como charlatão e impostor. Ao fazer nova tentativa em sua cidade, administrou quantidade excessiva de gás e o paciente teve parada respiratória e por pouco não morreu. Desanimado, abandonou suas experiências e a profissão de dentista. Outro dentista, de Boston, William Thomas Green Morton, dentista em Boston, perseverou no propósito de obter extrações dentárias sem dor e sem colocar em risco a vida do paciente. Substituiu o NO2 por éter, após consultar seu ex-professor de Química, Charles Thomas Jackson, que lhe recomendou usar somente éter retificado e indicou-lhe o local onde poderia obtê-lo. Os resultados foram surpreendentes e muito superiores aos obtidos com o NO2. Morton anteviu a possibilidade da cirurgia sem dor e obteve permissão para uma demonstração no Massachusetts General Hospital. Assim chegamos ao dia 16 de outubro de 1846. Ao término da histórica operação que mudou o destino da Cirurgia, Warren proferiu as seguintes palavras: Daqui a muitos séculos, os estudantes virão a este Hospital para conhecer o local onde se demonstrou pela primeira vez a mais gloriosa descoberta da ciência. Na realidade, esta não era a primeira intervenção cirúrgica realizada com anestesia geral pelo éter. Na pequena cidade de Jefferson, no Estado da Georgia, nos EE.UU., em 1841, um jovem médico de nome Crawford Williamson Long tinha o hábito de realizar sessões de ether frolics em sua casa. Long participou de várias sessões e teve sua atenção despertada para a insensibilidade que se produzia durante os efeitos do éter, pois, por mais de uma vez, havia se machucado sem nada sentir. Teve, então, a idéia de utilizar o éter em pequenas intervenções cirúrgicas. O primeiro paciente a ser operado sob a ação do éter foi um seu amigo de nome Venable. Na presença de várias pessoas Long extirpou dois pequenos tumores na nuca do paciente sem que ele nada sentisse. A insensibilidade poderia ser atribuída à hipnose e não ao éter e para obter a prova decisiva, Long aproveitou-se de uma oportunidade ímpar. O filho de um escravo havia queimado a mão e necessitava amputar dois dedos. Long amputou o primeiro deles sob a ação do éter e o segundo depois de cessado o efeito do éter. O rapaz acusou dor somente na segunda amputação. Estava assim demonstrado o poder anestésico do éter. Long chegou a operar 8 casos com anestesia pelo éter, porém acreditava que o método não servisse para grandes intervenções a não ser que o paciente inalasse o éter o tempo todo, o que seria arriscado. Circularam rumores na cidade de que o médico estava pondo em risco a vida dos pacientes e certo dia uma Comissão constituída das autoridades locais foi ao seu Consultório pedir para que ele renunciasse a essas práticas audaciosas, pois, se um doente morresse ele poderia ser linchado em conseqüência da revolta da população, costume que era freqüente na época. Long abandonou o uso do éter e as suas experiências pioneiras só se tornaram conhecidas muitos anos depois. Com o sucesso de Morton, Jackson, que gozava de prestígio internacional, reivindicou para si, nos países europeus, a prioridade da descoberta, acusando Morton de desonestidade. Wells, desgostoso e amargurado com o seu fracasso, cometeu desatinos, foi preso e suicidou-se na prisão aos 33 anos de idade. Morton, empobrecido, desacreditado por Jackson, faleceu subitamente em uma via pública aos 49 anos de idade. Com sua morte, houve um despertar da consciência norte- americana a seu favor e no local de sua sepultura foi erigido um monumento com o seguinte epitáfio: Aqui jaz W.T.G. MORTON, o descobridor e inventor da anestesia . Antes dele, a cirurgia era sinônimo de agonia. Por ele foram vencidas e aniquiladas as dores do bisturi. Depois dele a ciência é senhora da dor. Erigido pelos cidadãos reconhecidos de Boston. Jackson, ao tomar conhecimento deste epitáfio, sentiu-se finalmente derrotado, tornou-se alcoólatra e terminou seus dias em um Hospício, onde morreu em 1880, aos 75 anos de idade. Long viveu o resto de sua vida arrependido por não ter divulgado sua descoberta, realizada em 1842, portanto, quatro anos de Morton, e faleceu subitamente aos 63 anos de idade. Como escreveu Fülöp Muller, dir-se-ia que uma estranha maldição pairava sobre todos os que consagraram sua vida e sua obra a lutar contra a dor. Embora Crawford Long tenha sido o primeiro médico a utilizar-se da anestesia geral pelo éter, o mérito e a glória da sua revelação para o mundo cabe, inegavelmente, a William Thomas Green Morton.
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