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A anestesia de Koller
(Milton Silverman/ Trd. Monteiro Lobato)

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A anestesia de Koller A coca mata a fome. A coca mata a sede, a coca suprime o cansaço. A coca traz euforia. Seu uso diário vicia. Em 1860 o alcalóide cocaína foi extraído das folhas de coca traziadas do Peru para a Europa e o quimico alemão Albert Niemann a isolou. Este mesmo químico também descobriu que uma pitada de cocaína na boca deixa a língua insensível aos sabores e ao frio e ao calor. No verão de 1884, no Hospital Geral de Viena, os médicos tentavam descobrir se um paciente estava viciado em cocaína e para isso solicitaram a colaboração do jovem Carl Koller. um moço de vinte anos. Ele era um excelente experimentador, já conhecido pelos seus estudos de embriologia e efeito dos tóxicos em animais, porém o estudo da cocaína arrastava-se. Ademais seu sonho era especializar-se em doenças dos olhos, e por isso lamentou o tempo que andava perdendo com o estudo da cocaína. Certa vez um oftalmogista de Viena lhe dissera que: “a oftalmologia está clamando por uma nova droga que tenha efeito anestésico local. Os anestésicos existentes, clorofórmio, éter e óxido nitroso, não se prestam. Todos são muito perigosos na oftalmologia, sempre seguidos de náuseas e vômitos que destroem os delicados trabalhos que fazemos nos olhos. E infelizmente também não podemos usar a morfina e os brometos.Enquanto não descobrirmos um composto que pingando no olho produza a anestesia local, nada podemos fazer na catarata, na iritis e em tantas outras moléstias dos olhos.” Essas palavras não saiam dos ouvidos de Koller quando, de volta ao loboratório, pingou cocaína em sua língua e a sentiu insensibilizar-se. E pensou: - Se houver uma droga que faça nos olhos o que a cocaína faz na língua! Koller tocou na ponta da língua e não teve a sensação do toque. Beliscou e nada. De repente, uma idéia lhe ocorreu e Koller gritou: -Descobri, Leonard! Descobri um anestésico local para os olhos! É a cocaína. Pegou vários preparados e saiu da sala correndo direto para a sala do departamento de patologia experimental.. -Animais! Animais! Saiu da sua saIa gritando. Onde há animais? Chegando na sala de patologia procurou o servente e pediu: - Arranje algumas rãs e duas cobaias. Já! Enquanto o rapaz segurava em posição a primeira rã verde. Koller enchia a seringa com a solução de cocaína e pingava-lhe uma gota nos olhos. -Segure-a firme. É preciso que a solução não escorra desse olho para o outro. Esperaram trinta segundos, um minuto, dois, e então Koller fez a experiência: tocou no olho da rã que nada recebera, e ela lutou para fugir. - Ótimo! Doeu. Vamos ver o olho cocainizado. Segure firme. Repetiu o toque no segundo olho e, milagre dos milagres, a rã não se moveu. Koller, insistiu, arranhou o olho da rã, e ela nada de reagir. Arranhou mais forte, e sempre nada. A rã não dava sinal de sentir coisa alguma; estava apenas incomodada de estar se prestando aquilo. Ao o cientista concluiu: A cocaína anestesiou completamente este olho; é, portanto, um perfeito anestésico local. -Traga-me agora uma cobaia, para a repetição da experiência pediu Koller ao servente. O efeito da cocaína no olho da cobaia foi o mesmo que no da rã. Na segunda experiência o cientista concluiu: “No primeiro minuto, leve irritação; o animal pisca e contrai os olhos. A anestesia começa depois do primeiro minuto e dura mais ou menos dez, com três gotas de solução de cocaína a 2%. Durante a anestesia o animal não mostra nenhum sinal de dor provocada pelos testes: picada de agulha, cauterização com nitrato de prata, incisão profunda.” Depois ele decidiu levar seu preparado para que fosse usado na clínica de olhos do hospital, pois ele sabia que lá teria a oportunidade de ver seu experimento ser usado em humanos. Os médicos já estavam preparados para o horror dos gemidos da vítima, mas lá estava o paciente cocainizado sorrindo como se nada tivesse acontecendo, e isso em pleno decurso da operação. O segundo passo de Koller foi no departamento de laringologia, onde o Dr. Jellinek concordou em cocainizar a garganta de seus pacientes antes da intervenção cirúrgica. Em poucas horas a notícia da anestesia local de cocaína se espalhou por todo o hospital. E estava descoberto a anestesia local.



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