Condição de classe e posição de classe
(Pierre Bourdieu)
BOURDIEU, Pierre. “Condição de classe e posição de classe”. In: A economia das trocas simbólicas. São Paulo: Perspectiva. p. 3-25.
Como forma de fugir à concepção de estrutura como o produto da justaposição das partes constitutivas da sociedade, Bourdieu enfatiza o aspecto relacional dos elementos que compõem a estrutura. As propriedades de posição e as de situação estão intimamente ligadas e sua separação somente se justifica numa operação analítica. Apesar de não existirem em si mesmas, sendo afetadas pelos elementos com os quais coexistem, as classes sociais só podem ser devidamente compreendidas se for dada atenção ao sistema de relações do qual fazem parte. Tal cuidado impede a transferência indevida de esquemas descritivos e explicativos de uma sociedade a outra, ou a uma outra época numa mesma sociedade. O perigo é que com isso incorramos no “universalismo abstrato e vazio da ideografia” que, ao considerar os traços ou grupos culturais em sua rede de relações, impede a apreensão de formas e processos comuns. A comparação só pode ser feita efetivamente entre estruturas equivalentes ou entre partes estruturalmente equivalentes das mesmas. Isso nos permite pensar na comparação de sociedades distintas respeitando suas características particulares sem perder de vista os elementos comuns que as unem. A posição de um indivíduo na estrutura não pode se definir somente como uma posição relativa numa estrutura (“superior”, “média” ou “inferior”), é preciso também prestar atenção ao trajeto social, que aponta para o sentido que percorre determinada classe ou grupo. A abordagem estrutural permitiria captar traços transhistóricos e transculturais sem incorrer num relativismo estéril. Além da situação e da posição na estrutura social, que se referem às relações objetivas que os indivíduos estabelecem entre si, uma classe também é definida pelas relações simbólicas. Bourdieu se apóia na distinção feita por Weber entre classes e grupos de status para enfatizar o aspecto simbólico que possuem as classes sociais e a importância que as distinções simbólicas têm na definição de uma dada posição de classe. As marcas distintivas fazem com que o ter se traduza em ser, fazendo com que o que é socialmente adquirido se transforme numa ‘natureza’. É seguindo a lógica da distinção, que ocorre de modo a privilegiar a forma da ação em detrimento de sua função, que as ações simbólicas exprimem a posição social. É por ser marcado pela negatividade, ou seja, por sua relação opositiva com os demais termos do sistema que os signos se definem na estrutura social. No seu processo de funcionamento, os sistemas simbólicos, ao operar com homologias e oposições, acabam dando significado aos grupos e indivíduos numa estrutura social. Desse modo, as roupas, ao lado da linguagem e da cultura, passam a ter uma função expressiva, caracterizada pela associação e dissociação que garante as peculiaridades dos indivíduos e grupos. Ao mesmo tempo em que se afirma através da divulgação, uma marca distintiva, como a linguagem ou o vestuário, precisa, para continuar marcando um determinado grupo, mudar constantemente. Bourdieu relaciona posição no sistema de produção à posição na estrutura social a partir da afirmação de que, a busca por refinamento, por distinção, pressupõe certa disponibilidade de tempo para adquiri-lo, o que não está ao alcance de todos. Isto me lembra um filósofo antigo, que dizia que só os “homens de lazer” poderiam fazer política. O que importa numa sociedade hierarquizada não é somente diferir, mas “diferir diferentemente”, o que implica inclusive no apelo a costumes considerados ‘simples’por parte dos grupos de nível elevado e ‘extravagantes’ por parte dos grupos de nível superior. A posição de classe não somente é caracterizada por procedimentos expressivos, mas também por aqueles que traduzem uma certa posição na sociedade sem que haja intenção do grupo. Por isto é que quando há uma ênfase intencional dos atos objetivamente expressivos se verifica uma ênfase intencional dos atos expressivos intencionais a fim de alcançar a maximização do rendimento simbólico dos procedimentos expressivos. As classes sociais não estão igualmente disponíveis para o jogo da duplicação expressiva das diferenças de situação e de posição justamente porque além de critérios de pertinência a uma classe variarem de uma classe a outra, o jogo das distinções simbólicas se realiza dentro dos limites estabelecidos pelas coerções econômicas, sendo realizado por um seleto grupo de privilegiados.
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