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Um Édipo
(Armando Nascimento Rosa)

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O papel do Mito na peça “Um Édipo”, de Armando Nascimento Rosa

Os mitos existem desde sempre, porque desde sempre há seres que se destacam pelas suas acções, sabedoria e valor moral. E desde sempre, também, há quem assista para contar, para embelezar a história e conferir-lhe um cunho de grandeza que ela, provavelmente, nunca teve. Ou seja, esses seres diferentes conferem validade ao comportamento-modelo, à prática a seguir, mas é quem conta, a posteriori, que lhe atribui acções de excelência, tornando-os imortais. Um mito tem uma base real, que ajuda a conferir mais verosimilhança aos acontecimentos, e justifica-se pela manifestação de acções exemplares, cujo objectivo é moldar e condicionar os comportamentos humanos. E como moldador de comportamentos ganha força e mantém-se sempre actual, nunca se pondo a questão da sua validade, funcionando a nível didáctico e educativo, pois, só seguindo os seus preceitos e boas práticas poderá o ser humano alcançar também a excelência.
Foi no teatro que o mito começou a ter maior projecção. Os gregos divulgavam os seus mitos com o objectivo de domar a população, incitando-a a evitar certos comportamentos e a adoptar outros, e os romanos seguiram-lhe as pegadas. O que importava era educar seres com pouca instrução e levá-los a seguir uma linha de conduta que fosse benéfica para todos, a nível social. O teatro vai, portanto, funcionar como uma espécie de moldador de consciência(s), actuando a nível social e civilizacional, pondo a tónica na defesa de valores morais nobres e condenando os desvios a esses valores. Para esse fim usavam os gregos e os romanos os seus deuses, semi-deuses e heróis. Eram seres excelentes, magníficos, que se destacavam pela positiva, ou pela negativa, e cujas acções eram analisadas, defendidas ou condenadas, com o objectivo de uniformizar a prática e a vivência em sociedade.
Se é verdade que os mitos são dotados duma dimensão marcante e didáctica, na peça de Armando Nascimento Rosa, Um Édipo, essa dimensão é bem acentuada. Além de referir os acontecimentos que as transformaram em mitos, as figuras da peça fazem um balanço das suas vidas e do seu percurso, analisando as suas vivências. Funcionam, assim, como uma espécie de consciência analítica, de modo a fundamentar os desígnios que os deuses lhes reservaram.
Nesta peça, são apenas três as personagens que estão vivas: Édipo, Tirésias e Manto. Manto é filha de Tirésias e de Zeus e acompanha o pai, mas o seu maior desejo é ser actriz de teatro, honrando Dioniso. Édipo vive sem rumo, sem entender o que lhe aconteceu, sem encontrar um sentido para o seu passado de crime, castigo e vingança. Tirésias vai funcionar como uma ponte de ligação entre dois mundos, o dos vivos e o dos mortos, e vai ajudar Édipo a “encontrar-se”. As restantes personagens são fantasmas evocados para esclarecer os acontecimentos que levaram à perdição e auto-cegueira de Édipo.
Como em todas as obras clássicas, os mitos só funcionam se personificarem uma moral, se tiverem uma função de catarse, a lição de valores indispensável para ser possível subsistir em sociedade. Esta peça vai mais além desta função didáctica, na medida em que analisa, e quase questiona, a própria catarse. Assim, as histórias de todas as personagens são dissecadas com o objectivo de entender mais além das suas simples acções. Por isso é que, provavelmente, Tirésias, a ponte entre o mundo dos vivos e dos mortos seja cego, porque todo o desprendimento de quem não vê se torna imprevisível e objectivo. A cegueira parece, igualmente, aliviar a dor, uma constante na vida das personagens. A dor faz com que as personagens evoluam e cresçam, permitindo aos deuses preparar-lhes novas armadilhas. No filme Tróia, de Wolfgang Petersen, Aquiles comenta com Briseía que os deuses invejam os mortais por eles serem efémeros e, por isso, únicos e completos, daí a sua necessidade em os pôr à prova. Há, neste pensamento, uma inversão de papéis e deuses e homens alternam-se e desafiam-se. Os deuses castigam os homens com requintes de vingança; os homens castigam os deuses porque, simplesmente, existem. A linha é ténue e, se são os deuses os detentores e fazedores do destino dos homens, também os homens têm o poder de alterar o seu destino. Toda a peça gira à volta de entender este jogo, analisando as motivações de ambas as partes e suas acções consequentes - os verdadeiros objectivos do teatro: a reflexão e a libertação.
Esta obra é a prova da necessidade que o Homem demonstra em ter referências. Sejam elas divindades, ícones, seres corpóreos ou elementos da natureza, servem-lhe de modelos de conduta e boas práticas e apega-se a elas, justificando todos os acontecimentos diários e as suas consequentes reacções. Assim, toda a nossa estrutura comportamental está baseada numa busca constante de heróis e seres salvadores, cuja excelência inspira os mais fracos e os mais indecisos, levando-os a superar-se sempre. Na base desta necessidade reside o facto de toda a existência humana se pautar por situações destabilizadoras que levam os homens a desafiar os deuses, a si próprios e a meter mãos à obra na feitura do seu destino. Afinal de contas, a vida é mesmo isso.



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