O Príncipe Maçon
(Meister)
Lisboa, 18 de Julho de 1715
D. João, o Quinto, que por sangue de sua mãe Sophia de Neuburgo era tão germânico quanto seu tio Leopoldo I, Imperador da Alemanha e Arquiduque da Áustria, intrigava-se com os silenciosos rumores que, por entre as frinchas do Paço, lhe chegavam morredoiros. O que seria aquilo de gente como ele, Reis, Duques e Cardeais andarem em reuniões secretas vestidos com avental? Porque não era Ele convidado? Ele o Rei-Ouro, único na Europa a jorrar sombra sobre esse Rei-Sol de França? Seria por ter casado com uma sobrinha da sua própria mãe? Ou por esta ser a quarta na sucessão para Imperatriz da Áustria numa família em que mais tempo viviam os tordos?
A curiosidade não mata um Rei, mas moía-o o mistério.
Devasso contrito – amante de freiras e protector de padres – não podia buscar àqueles seus aliados as respostas pretendidas. Dos íntimos embaixadores, prostrados em enviaturas, recebia apenas lisonjas e mais pedidos de soldo. Pelas mesmas frinchas sabia-os envolvidos naquilo que já lhe soava a trama. Com esperança vã, chamara D. Luiz da Cunha a Lisboa mas a idade já só lhe movia que a pena que arrastava trémula pelos textos diplomáticos. Tentara o Conde de Tarouca, enviado ao País-Baixo, mas uma prosaica maleita impedira-o de viajar. Não ia por certo confiar no lenga-lengas de Londres. Esse, se o chamasse, até a nadar chegava mas seria tão monótono ouvi-lo como missa em fim de tarde. Demais, como sempre dissera, aquele Carvalho tinha pêlos no coração.
Só. Sentia-se só.
Cavalgaduras à carga, D. Manuel, o estoira-vergas, fazia a sua entrada no Paço. Rompendo o cordão de Tedescos, os alemães archeiros reais, galgava escadas acima aos gritos de “Alteza Real !”. Num permissivo gesto, el-rei dava-lhe entrada. Com vénia e reverência mas sem o anel beijar, o jovem Príncipe arremessava que ía fazer dezoito e queria viajar.
Com a calma pelos ajustes, el-rei que o destinara a Ordens Sacras, ergueu-se de um fado e assentou-lhe uma bofetada. Um silêncio de cisma invadiu a sala do trono. Carregada de titulares que tinham vindo a despacho, parecia mais mortuária que sala de assento real. Pela mente dos circunstantes se percebia que jamais haveria honra que lavasse aquela afronta.
Com a nódoa do anel na cara, o Infante aturdia sem reacção. Um gesto irreflectido e a sua jovem vida nada valia. Mas clérigo não seria! E num arrisco de coragem virou espaldas porta afora.
Perturbado, D. João ordenou o fim do expediente caindo lerdo sobre o trono. Era aquele maldito feitio materno, pensava, revendo em mente os azedumes passados que quase fizeram D. Pedro, seu pai, meter a rainha a ferros. Na verdade, adensada pelo apetite à bebida, D. Sophia apenas escapou à grilha pelo seu sangue Imperial. Quanto a este, jocava-se na corte que lhe corriam restos por entre um mar de cerveja, bebida, aliás, de que lançara moda em Portugal, qual D. Catarina, sua cunhada, fizera com o chá em Inglaterra.
Naquele momento, recordou a resignação paterna e, com um suspiro soluçado de emoção, mandou correr pelo irmão e que lho trouxessem sem mácula. Saiu a guarda alemã no encalço do Príncipe com o capitão dos Tedescos a rogar pragas à sorte e a arengar maldições teutónicas ao génio dos dois irmãos.
O Príncipe vivia nas cercanias de Vale de Lobos, em Belas, a sete léguas de Lisboa. Ali estabelecera o que denominara “a sua corte de aldeia “e se rodeara de letrados e artistas.
Filho sétimo de D. Pedro II, usava Conde de Ourém em abono de um título real de seu irmão, criado em 1370 pelo seu avoengo D. Fernando I. Conhecido pelo sangue na guelra, diziam-no parecido com o pai, que tomara a coroa ao irmão por amores da própria cunhada. (cont.)
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