Transação Penal e Ação Privada
(BARROS SANTOS; Tiago Antonio)
A Constituição Federal de 1988, em seu art. 98, inciso I, já previa a implantação dos Juizados Especiais, almejando uma justiça dinâmica, rápida e desburocratizada, com procedimentos pautados pela racionalidade, celeridade, informalidade e otimização, tudo isso com um baixo custo processual. A Lei 9.099/95 veio a instituir os Juizados Especiais Criminais, tendo como objetivos a conciliação, a transação e a reparação dos danos sofridos pela vítima, sempre com a aplicação de penas não privativas de liberdade ao autor do fato. [BR]Os Juizados Especiais Criminais vieram para julgar as chamadas infrações de menor potencial ofensivo, aquelas em que a pena cominada é igual ou inferior a dois anos. A transação penal, por sua vez, mostrou-se como instituto mais inovador da referida lei, prevendo a aplicação imediata de uma pena consistente em prestação pecuniária ou restritiva de direitos ao autor do fato, antes mesmo do início do processo penal, desde que atendidos os requisitos legais por parte daquele. [BR]O art. 76, da Lei 9099/95, estabelece que havendo representação ou se tratando de ação pública incondicionada, o Ministério Público poderá propor a transação penal, dependendo de aceitação do autor do fato, para posterior homologação do juiz competente. Contudo, o legislador silenciou sobre os delitos de ação exclusivamente privada - que não são raros -gerando séria discussão doutrinária acerca deste tema, culminando na formação de diversas posições doutrinárias e jurisprudenciais distintas. Alguns entendem ser incabível a transação penal nas ações privadas, utilizando a justificativa de ser proposital o silêncio do legislador acerca deste tema. Outros defendem a posição de que é cabível a proposta de transação penal nas ações privadas, desde que o querelante a formule. Uma terceira corrente entende que o Ministério Público é quem deve propor a transação, sendo, todavia, imprescindível a anuência do querelante. Por fim, há quem ache que o Ministério Público é legitimado para propor a transação penal nas ações privadas, independentemente da concordância ou não do querelante.[BR]A doutrina, inicialmente vacilante, já admite quase que de forma unânime a possibilidade jurídica da transação penal na ação privada. Não há como ignorar o propósito despenalizador da transação penal, aplicando-a somente em delitos que ofendem a sociedade - ação pública - e desprezando-a em infrações onde a ofensa é exclusivamente à vítima - ação privada. Tal interpretação literal da norma ofende diretamente ao princípio constitucional da isonomia, o que é inadmissível.[BR]Assim, trata-se de vital importância definir quem é legitimado para a propositura da transação penal, na audiência preliminar: a vítima/querelante ou o Ministério Público, no caso deste último, de forma originária ou subsidiária?[BR]Parece o mais lógico que o titular da ação privada seja o legitimado para transacionar, neste caso, o querelante. Assim, por uma questão de ordem jurídica, a proposta de transação penal deve ser do querelante/vítima. Todavia, é previsível que haja uma certa resistência do querelante, afinal, espera-se que a vítima tenha o desejo de ver o autor do fato processado ao invés de vê-lo pagar uma prestação pecuniária ou prestar serviços comunítários por um pequeno período de tempo. Destarte, provavelmente o querelante recusar-se-á a propor a transação penal, ou ainda, poderá propor prestação inexequível para o autor do fato. E é justamente nesta oportunidade que o Ministério Público deve exercer a sua função de custus legis, intervindo e propondo a transação penal, de modo a assegurar o caráter despenalizador do art. 76 da Lei 9099/95. Não poderá o representante do Ministério Público, que estará obrigatoriamente participando da audiência preliminar, permitir que se inicie um processo penal por meio de uma queixa-crime, quando o autor do fato preenche os requisitos legais para a aplicação da transação penal.[BR]Doutrina e jurisprudência ainda não são pacificados neste sentido, mas parece-nos que esta posição apresentada é a mais sensata, afinal ela não permite o desenrolar de um processo penal por mero capricho da vítima e ainda observa o princípio constitucional da isonomia, ao quais jamais podemos olvidar.
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