Os horizontes de Jason Carneiro
(Jason Carneiro)
Se há alguma coisa que se pode exigir do poeta é que ele conheça a poesia e como esta letra não tem idade a afirmação vale tanto para a poesia dita clássica como a mais contemporânea possível, de preferência livre de rótulos. Só lendo muita poesia, de princípio alimentando-se como criança, com fome e sede, sem a preocupação de avaliar níveis de qualidade, o poeta poderá exigir de si algo mais do que pensa que pode realizar: é a superação. Conhecer seus pares é o ABC do poeta. Não vou falar aqui da técnica, da estética ou das excelências de Jason Carneiro, porque Pedro Lyra, Ivan Junqueira e Alberto Guerreiro, o fazem com muito mais competência e talento. Alberto Guerreiro, em alentada introdução intitulada “Alma Forasteira”, aliás, dá uma lição de como se deve comentar um livro de poesia. Nesse exemplar prefácio, escrito de modo bem diferente das críticas que correm por aí, cuja técnica é a mesma à dos fabricantes de salsicha, lingüiça e demais embutidos, Alberto Guerreiro desenvolve uma análise do livro enxuta, objetiva e sem fogos de artifício. Cabe-me admirar a simplicidade com que Jason Carneiro demonstra veneração por Abgar Renault, deplorando que a divulgação da obra do poeta de “A outra face da lua” encontre dificuldades de diversos níveis. As letras brasileiras precisam da poesia de Abgar Renault. Entre todas as artes somente a poesia é capaz de produzir esse tipo de efeito no qual a influência tanto mais forte se desencadeia em novas criaturas, sem que os anos tenham qualquer peso no processo. Tomara que os impasses sejam superados para que a poética de Abgar Renault não se transforme em saudade. Em “Assim nascem os horizontes” a influência se faz não como imitação ou recriação, como seria injusto supor, mas exatamente no destravamento dos conceitos básicos do fazer poético, que afetam toda a construção do poema, da escolha temática até às miudezas gramaticais. O que Abgar Renault desenvolveu serviu de exemplo e lição. A poesia de Jason Carneiro é de constante e meticulosa reinvenção. É assim que nascem os horizontes, é assim que nasce a liberdade de criar. Se Abgar Renault foi mestre em dosar cadência e ritmo nas frases longas, Jason Carneiro tempera o tom das palavras com novas sílabas, de forma que tudo ganha uma leve sonoridade, um batuque suave, que surpreende. Se a cadência exigir, o poeta não hesita em encurtar a frase e tudo se limita a som e ritmo. Tudo na medida certa, sem excesso, o absolutamente necessário. Eis como influência não significa imitação, mas estímulo para novas aventuras. Com o desaparecimento recente de Fernando Sabino se repete o drama da obstrução autoral. Antes mesmo do corpo esfriar os herdeiros declararam que nenhuma obra inédita dele será publicada, por desejo do próprio Fernando Sabino. Se Max Brod tivesse feito as vontades de Franz Kafka ou Manuel Bandeira as de Mário de Andrade, todos perderiam. Para encerrar esta honesta indignação, traço um paralelo entre Abgar Renault e Artur Rimbaud. Quis o destino que, em determinada fase da vida, largassem a poesia em troca da existência privada, dita normal para cuidar da própria vida, livres da desilusão que a poesia nos envenena fazendo pensar que é, ela própria, caminho para a imortalidade. Pois para nós, condenados, não interessa o Rimbaud contrabandista e comerciante nem o Renault educador e político, mas sim nos embebedar com a poesia que em breve lapso de tempo ambos nos honraram legar. E nada mais.
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