Dê férias para seu cérebro
(Juliana Tiraboschi; Mariane Gusan)
Dê férias para seu cérebro
Sejam essenciais para a sobrevivência ou banais, as informações só são armazenadas enquanto for necessário. "Suponha que na última quarta-feira você tivesse passado muito mal depois do almoço. É importante que você retenha essa informação por certo período de tempo para que você identifique o que causou o mal-estar e tome providências. Mas passada uma semana aquela informação pode simplesmente entrar em decaimento. Seria irrelevante arquivar", exemplifica o neurofisiologista Gilberto Xavier.
Assim como nós fazemos faxina e tiramos do armário as roupas que não queremos mais, não seria ótimo se pudéssemos selecionar as informações que não nos interessam e eliminá-las para sempre de nosso cérebro? "Fazemos um pouco disso durante as férias", diz Iván Izquierdo. Quando viajamos ou descansamos, conhecemos lugares diferentes e realizamos atividades distintas das habituais. Passamos a pensar cada vez menos nos fatos do dia-a-dia e vamos os substituindo por novas experiências que vão, de certa forma, deixando as anteriores de lado. Claro que, quando voltamos ao nosso cotidiano, aquelas lembranças habituais retornam, por isso não há nada melhor do que sair da rotina para refrescar as idéias.
Esquecemos também por falta de atenção, quando o registro de alguma informação ocorre de forma superficial e os dados não são armazenados de forma consistente e duradoura. "Também esquecemos quando não entendemos, pois para uma informação perdurar ela deve ter um significado claro. Poucos se lembram do formato do mapa da Rússia, além dos russos, mas o da Itália quase todos se lembram, pois quando o estudamos vimos que tem a forma de uma bota: demos um significado ao contorno, o que favoreceu a consolidação da informação", exemplifica a neuropsicóloga Mirna Portuguez, da PUC do Rio Grande do Sul. Mas o aprendizado, se depende da memória, também necessita da eliminação de informações. "Sem o esquecimento não aprendemos. A partir do momento que se estabelece um conceito, todas as particularidades de todas as espécies de objetos ou seres que eu estou conceituando são abstraídas", ensina a psicóloga Maria Alice de Mattos Pimenta Parente, do Instituto de Psicologia da UFRGS.
Pancada na cabeça
A amnésia, mais comum no cinema do que na vida real, é o retrato preferido do esquecimento nas telas, tanto em dramas quanto em comédias. Acompanhe sua evolução:
1915 - "Pérola Branca" (1915) é um bom exemplo dos primeiros dramas que se utilizam da perda de memória (tão fantástica quanto o resto de sua trama). Depois de um acidente, a protagonista vira rainha de uma tribo e mais tarde mercadoria nas mãos de piratas japoneses, até que miraculosamente seu grande amor a faz recuperar a memória
1926 - O cinema começa a ter som e até o momento há pelo menos dez filmes com o esquecimento como mote
1929 - É a primeira vez que um filme sugere uma nova lesão para "curar" a amnésia. Para aqueles que perderam a memória, nada melhor que uma nova agressão para recuperá-la, idéia de Tarzan, em "Tarzan, O Tigre" (1929)
1940 - Em um novo movimento do cinema, os desmemoriados começam a assumir a personalidade de pessoas parecidas com eles. Em "O Grande Ditador" (1945), um velho soldado de guerra é confundido com o ditador que governa o país e assume seu lugar. Essa nova possibilidade de trama vira modelo para outros filmes
1951 - Amnésia e esquecimento viram brincadeira de criança, apresentado no cinema inclusive pelo recém-lançado Tom e Jerry, depois transformado em série de TV
1962 - Na década de 60 surge a idéia de esquecimento pós-traumático ou psicológico. Assassinos, soldados e vítimas são acometidos de amnésia após testemunharem crimes e mortes. O francês "Sempre aos Domingos" (1962) é um dos precursores dessa linha e trata da vida de um piloto após a Guerra do Vietnã
1990 - Pouca coisa muda nos filmes que baseiam seu enredo no esquecimento, até o ótimo "Feitiço do Tempo", em que há um esquecimento geral inexplicável. Todos (com exceção do protagonista) começam a viver o mesmo dia todos os dias
1997 - Nos anos 1990 e 2000, o esquecimento no cinema é tecnológico e marcado por máquinas capazes de apagar a memória. Isso acontece em "Homens de Preto" (1997), "O Pagamento" (2003) e "Brilho Eterno de Uma Mente sem Lembranças" (2004)
2003 - Em um desenho animado aparece um dos melhores personagens amnésicos da história. Dory, a peixinha azul de "Procurando Nemo"(2003), é considerada pela pesquisadora Sallie Baxendalle a mais fiel representação de um paciente com distúrbio profundo de memória. Não há mudança nem perda de personalidade e a personagem tem lapsos de lembranças o tempo todo. Outra boa referência é "Amnésia" (2000), baseado na história real do paciente conhecido apenas como HM, amplamente citado na literatura médica especializada.
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