Ouvindo o silêncio
(Domingos Pellegrini)
A luz apaga, a tevê escurece, o menino fala:E agora vô?_ Agora, vamos fazer como quando eu era menino. Vamos acender uma vela e ficar olhando.O vô procura tateando na gaveta, acende a vela na mesinha da sala, senta no chão, o menino senta do lado. Ficam olhando para a pequena chama. A unica coisa que tô, vendo vô, é que você sentou no chão_ Já não é uma grande coisa? A gente esquece como é bom sentar no chão, andar descalço, tomar agua na mão, andar na chuva....O menino fica vendo aquele homem ali, seuavô de repente desconhecido, cantarolaruma musiquinha com o rosto sombreado pela vela.Que musica é essa vô?_ Uma que as lavadeiras cantavam batendo roupa na beira do rio, onde eu menino ia nadar.O menino fica olhando espantado:então o vô ja foi menino!_ Eu tambem vou ficar velho um dia,vô?_Vai. Maspode ser um velho menino. OU podeser um menino velho desde ja._Como assim, vô?_ É só ficar serio que você envelhece. Se rir remoçaO menino apaga a vela com um sopro, o vô acende novamente._ por que você fez isso? O menino não responde, assopra avela de novo. O vô ralha:_ Mas por que isso, moleque?O menino solta no escuro seu riso cristalino:_Pra ver você bravo, vô! Ai me da vontade de rir....Continuam no escuro._ não vai mais acender a vela, vô?_ que vela? Fica quieto, ouve o silêncio.Ficam em silêncio, ouvindo o s barulhos da escuridão. Um cachorro late longamente longe.Estalos. cricris. Vento farfalhando folhas. Sussuram:_ Quanta coisa, vô! Por que eu nunca ouvi isso?_ Por causa da tevê sempre ligada ea luz sempre acesa.Agora fica bem quieto, vê se ouve o coração.silêncio._É um tumtum lá no fundo, vô?A voz do vô sai do fundo, do peito:_É. É o rio mais antigo, orio do sangue pulsando. Um rio que tem corredeira, quando você corre.Um rio que gela, quando você tem medo.Um rio que dança, quando você canta.
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