CRONICA INTIMA - PARTE 1
(José Paulo de Andrade Filho)
Naquele fim de tarde cintilante, o sol despejava raios de pura beleza sobre o cume das montanhas à minha frente; as flores, balouçadas pelo vento bafejante que vinha do mar, exalavam um perfume suave... Eu andava distraído, pensando na graça que havia alcançado; no sentimento que nascia em mim mais uma vez, alimentado por um doce desejo de abrir meu coração e imantá-lo de uma beleza que, havia muito, não surgia. Alheio às pessoas que passavam ao meu redor deixava-me conduzir por aquele sentimento de universalidade, de um prazer que fazia com que meu coração pulsasse mais rápido, embevecido pela simplicidade da vida e pelos carinhos que, tão ternamente, a existência consciente nos oferece. Sentei-me num dos bancos que margeavam aquele jardim, por onde meus pés, descalços, descansavam daquele deslizante caminhar. Minha mente revivia momentos vividos, encontros e desencontros pelos quais, inúmeras vezes, passei. Lembrava-me de algumas pessoas que, certamente, não desejava rever e, algumas outras que, com certeza, gostaria que estivessem ao meu lado pelo resto da vida. Olhando o mar à minha frente, via o vai-e-vem das ondas. Sentia-lhes o prazer de cumprir, sagradamente, sua tarefa ante a natureza, sua majestosa mestra... Meus olhos se perdiam no vazio deslumbrante daquela visão que, se aproveitada consciente e insistentemente, levar-me-ia ao encanto do êxtase. Deixei-me conduzir por aquelas doces lembranças que me invadiam amigavelmente. No fundo de minh'alma, um vago temor, não um medo que me inquietasse a paz sentida neste momento, mas, um receio de que, a qualquer momento, do fundo da mais íntima memória, um jorro de lembranças me tirassem daquela imersão em tudo que me cercava. Porém, nada de novo, a não ser, um desejo crescente de deixar-me alimentar pela sensação absoluta de um amor que despontava apaixonadamente em mim. Repassando os que pela minha vida já passaram, percebia que cada um trazia consigo sua parcela intrínseca de presença, de paz de espírito, sentimentos e amor. Todavia, nenhum era igual ao outro, apesar de o sentimento (amor) ser o mesmo em todos os seres humanos, em cada um deles sua manifestação está atrelada à capacidade que cada um tem de sentí-lo e expressá-lo fielmente. Mas, este rosto, este sorriso que não me abandona, que me enleva com sua simples lembrança; o seu toque, o seu carinho aliado às carícias oportunas, conquistam-me a todo o momento, absorvem-me num enternecimento difícil de explicar em simples palavras, mas, facilmente inteligível ao coração que, célere, inquieta-se ao mínimo pensamento. Intimamente, sou feliz! Sinto uma felicidade íntima capaz de suprir todo um vácuo que, fortuitamente, queira se instalar em meu ser. Mas, toda felicidade para ser mais do que completa deseja completar-se, ainda mais, a uma outra que lhe seja idônea. E, assim, enquanto os dias passam, percebo que, mesmo sofrendo ante a dor da saudade ou mesmo do esquecimento, aquieto-me, pois sei que, apesar de nem tudo durar para sempre, sempre haverá o eterno prosseguir e conquistar. Nesta minha felicidade, encontrei...! Encontrei um mimo, um encanto, uma alegria que se coadunava com a minha e me absorvia em sua simplicidade inocente; e, talvez, infantil! Não por sua ingenuidade e ignorância, mas, por sua pureza íntima, seu desejo objetivamente expressado, sua idealização de que, em algum momento, o amor não se perde e, sim, se conquista constantemente. Neste meu meditar, não me dei conta que a noite caíra. Com ela, estrelas já surgiam no céu - cintilavam singelamente. Do brilho que emanavam, uma fagulha de esperança me inundava e me acariciava as mais íntimas fibras da alma. Falavam-me de um entardecer longínquo que deixara para trás e, neste momento, mergulhava no mais profundo de minhas cogitações, no mais admirável do ser, Eu mesmo! Ao longe, um rosto surgia na imensidão de minhas oníris cogitações. Sua expressão de prazer, seus olhos que reluziam uma paixão profunda, penetravam os meus e me confessavam um desejo casto de se aliar às minhas mais singelas impressões. Divagando, acreditava ser mais um truque de minhas visões, mais um devaneio de uma alma apaixonadamente entregue às delícias de um amor a mais para viver. Porém, assim não o era. Sua forma, delineada pelas mais belas curvas que somente um espírito animando um corpo pode empreender, alinhava-se em meu campo de visão e seu andar era tão leve, tão sensualmente impetuoso que, a seu lado, tudo se perdia e somente o brilho emanando dos seus gestos me prendia, acorrentava-me a atenção num foco nitidamente arrebatador...(continua)
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