CRONICA INTIMA - PARTE 2
(José Paulo de Andrade Filho)
A manhã surgia lá fora, bafejada de raios de sol e de uma brisa suave que balouçava a cortina jeitosamente aberta com seus caprichos nada arredios. Preguiçosamente, levantei e fui andando em direção a essa luminosidade que me convidava estreitamente a refletir sobre o que a noite me trouxe de tão prazeroso. Olhei para trás e seu corpo descansava sobre a cama. Coberto por um lençol fino, por onde sua silhueta surgia delicadamente, suas formas me faziam lembrar dos momentos aconchegantes e quentes que passamos juntos. Com um sorriso no rosto, voltei-me em direção à janela que parecia me convidar a vista lá fora. Meus olhos, marejados de uma felicidade que há muito não sentia, espalhavam-se por sobre a imensidão que se desdobrava a minha frente. Um céu azul, um mar delirantemente calmo se perdia ao longe, como se quisesse alcançar os recantos infinitos de sua própria existência - era assim que me sentia! Tal qual aquele mar. Sentia meu ser crescer, regurgitar em si mesmo uma ânsia serena de crescimento. Atrás de mim, um suspiro breve, uniforme, declarava que em breve seus sonhos se perderiam no inconsciente e seus olhos se abririam para esta realidade. Ah, se meu próprio ser pudesse alcançar a plenitude de tua alma! Se minhas lacunas pudessem ser preenchidas pelos encantos de tua ousadia incólume! Se minhas horas pudessem se concentrar na contagem de teu tempo! E meus desejos pudessem de si mesmos brotar o licor da eterna aliança, talvez, desdenharia meu sumo prazer para deleitar-me na epopéia de tuas inconseqüentes aventuras que de furor depreciativo, nada tinham, mas, carregavam consigo uma explosão de sentimentos à mim somente dirigidos. Adiante, onde a vista se perde e a mente se inclina em respeito acariciante, deixei meu pensamento me conduzir. Célere, suas asas se apressavam a me incentivar o desprendimento indeciso que só as almas em profusão e íntima alegria são capazes de sentir. Suas mãos declinavam-me o toque da ventura (definitiva?) que não saberia determinar, mas, deixavam-me a impressão de que os sonhos de uma nova aurora feliz nunca se desfariam, nem por ninguém, nem por nada. Revolvendo minhas lembranças, memórias nada inertes dos instantes em comunhão, sentia aprofundar-me numa letargia desambaraçante. Seus predicados vinham-me a consciência por um túnel de claras luminescências; seu carinho banhava-me o corpo em toques de fervor e inominável igualdade de sentimentos; nossos corpos somavam-se às inúmeras aquiescências dos instintos que só eles mesmos são capazes de conduzir; seus lábios, em profusão de beijos, despejavam-me em ondas de frenético destemor, delirantes sonidos de beijos e toques eróticos.
Ah, realidade! Chamavas-me a indecência do tempo que se fazia desertor dos meus mais puros momentos. Pois que, quando a felicidade íntima nos circunda e nos toma, o próprio tempo perde sua razão, as horas deserdam sua corrida tresloucada e os minutos dispersam-se na iminência de um colapso atemporal. Porém, na luta entre o estar e o ser que travava àquele momento, decidi que o ser seria o imperador do meu instante e o estar o subalterno, que dominado pelo destemor da minha insistência, quedaria silencioso à razão da minha intolerância.
(continua)
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