Vidas invisíveis - crime e psiquiatria
(Ana Paula Almeida Vieira Monteiro)
· Objecto de estudo, uma unidade de internamento de Psiquiatria Forense integrada num hospital psiquiátrico constitui um microcosmos específico onde se intersectam uma multiplicidade de realidades passíveis de análise sociológica. Conjugam-se aqui as especificidades e funções sociais das instituições psiquiátricas, suportadas por um modelo de conhecimento científico radicado no poder médico. Por outro lado os doentes têm um estatuto jurídico sui generis e a existência destas instituições tem outra função social - a resposta do sistema judicial situações de crimes ocorridos que os agentes são portadores de anomalias psíquicas graves e, como tal, considerados inimputáveis. A dinâmica concreta destes serviços é um laboratório vivo da forma como se articulam o sistema judiciário e o sistema de assistência psiquiátrica em Portugal. É também o retrato da forma como os modelos de reintegração social são efectivamente vividos e postos em prática e de que forma os sistemas de desigualdade se perpetuam. O próprio estatuto do doente mental internado e o seu percurso institucional pode ser fontes de tensões e conflitos mais ou menos expressos entre o poder médico e o poder judicial, em que a salvaguarda dos direitos fundamentais dos doentes pode ser mais fragilizada.
Estes doentes são perigosos. A noção clínica e jurídica de perigosidade social conjugam-se aqui, mas a dimensão sociológica está ainda por explorar.
Por último, as pessoas. Quem são as pessoas internadas nestes serviços, quais os seus percursos sociais e de exclusão? Fazer uma caracterização e diagnóstico social da população internada neste serviço foi um dos objectivos deste estudo. Identificar os seus percursos sociais e percursos institucionais enquanto sujeitos de direitos, clarificar as dicotomias entre discursos e práticas quotidianas, analisar elementos concretos de estigmatização, foram outras linhas de investigação propostas.
Os doentes mentais, sobretudo os doentes com grave desorganização mental e deterioração da vida social, representam um grupo que ocupa os estratos sociais mais baixos, em termos de organização social. Se, para lá da patologia psiquiátrica diagnosticada, tiveram comportamentos sancionáveis penalmente, ainda que comprovada a sua inimputabilidade, o estigma social é particularmente intenso. Estes doentes cometeram crimes, alguns com extrema violência e, por vezes, contra pessoas com quem tinham grande proximidade relacional e afectiva. De que forma estes comportamentos são percepcionados pela comunidade de pertença, que mecanismos de protecção e rejeição suscitam e até que ponto esta dimensão se reflecte na dificuldade de reinserção social?
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