Ensaio Sobre a Cegueira
(José Saramago)
E se ficasse cego? Mas cego não de uma cegueira daquelas que todos provamos quando fechamos os olhos, mas de uma cegueira branca de leite como se estivesse num buraco negro visto em negativo de película fotográfica. E se, mais incrível que isto, a sua cegueira apanhada sabe-se lé como, se revestisse de uma carácter de epidemia, mas de epidemia tão virulenta que nem se tratasse de gripe? A príncipio, um aqui outro ali, ninguém daria por nada, mas quando a verdade se torna mais óbvia por força dos números o pânico começa a estender as suas garras e prende-se tão fortemente aos poucos que ainda mandam que a solução é apenas uma. Que se aparte os que não são mais como nós! E que se os deixe à sua sorte! Mas vem má hora a decisão. Os destinos deste canto do mundo já foram tecidos. Provarão todos e apenas estes o sabor desta cegueira branca. Todos excepto um! Uma, a bem dizer. Pois alguém tinha de servir de testemunho à verdadeira tragédia que são os homens, e não a cegueira que se lhes ataca. E ergue-se esta mulher que não foi tocada pela pestilência branca, do meio dos que se diriam seus pares não fosse ela a única que verdadeiramente vê ali. E vê ela o desenrolar dos dramas do egoísmo, do orgulho, da perversidade, da ignomínia que é ser-se homem no meio do férreo sabor do sangue, do fedor das excercências dos outros e do quente das lágrimas choradas pela falta de sorte ou de fé, quem sabe.Mas eis que, enquanto se ainda interroga pelo facto de ter sido poupada a esta prova, ela acaba, mais rápido ainda do que o seu início. E ali fica ela no meio dos outros que agora vêem, mas não viam, e não viram a verdadeira face do Homem, nos seus mais belos e mais horrendos momentos! E que se cale o mundo e se esqueça o que a história lhe grita a plenos pulmões, porque a história está lá atrás.
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