Admirável Mundo Novo
(Aldous Huxley)
Nunca se esqueça... Suas impressões digitais são únicas. As características de seu rosto também. Até mesmo sua inteligência é exclusiva e particular. Não há, apesar de existirem muitas semelhanças, ser humano duplicado (ou duplicável). Nem as técnicas de clonagem permitem a concepção de outro ser vivo que apresente as mesmíssimas características do elemento original que porventura tenha sido “reproduzido” em laboratório. Mesmo no momento em que vivemos, quando a ciência busca incessantemente a fórmula da duplicação de seres vivos através dos processos de clonagem, é praticamente impossível que a reprodução perfeita possa acontecer. O que temos e/ou teremos, mesmo num futuro longínquo, serão esmeradas e belas cópias que no aspecto externo, como que representando as embalagens ou invólucros humanos, conseguem falsear a realidade e apresentar os “não-seres”, concebidos não a partir de relações entre um homem e uma mulher, embalados por uma paixão, provenientes de um tórrido romance ou de um amor de longa duração... A essência humana composta a partir de informações genéticas derivativas de gerações e gerações anteriores de seres humanos que formaram famílias e perpetuaram seus nomes, suas experiências, seus conhecimentos e realizações será substituída por bancos de dados e pelo aproveitamento frio e indiferente de características humanas compradas em futuros bancos de genes...A alma que caracteriza as melhores (e as piores) qualidades humanas será substituída pelos circuitos eletrônicos e por chips que servirão como orientadores do pensamento, da ação, dos sentidos e das relações na Terra. A lógica irá imperar e a indiferença se fará sentir no estabelecimento de amizades e amores artificialmente concebidos e vividos. Teremos a paz e a perfeição. Nossos corpos serão anatomicamente belíssimos. A imperfeição será varrida da terra como uma chaga que trazia ao convívio os feios, os obesos, os anões, os deficientes físicos ou mentais, os carecas ou os dentuços ao convívio dos “perfeitos” mais belos espécimes humanos. Nossa capacidade mental será devotada à produção daquilo que nos é essencial e a cada um será dada desde o princípio de sua vida uma atribuição, uma responsabilidade pela qual irá contribuir para o bem geral da coletividade. Em nossa criação e durante os anos iniciais de nossas vidas seremos condicionados a acreditar que estamos fadados ao exercício de uma determinada função e a um nicho específico dentro da sociedade para a qual fomos criados. Seremos o produto de uma linha de produção de seres humanos que a cada momento produz 12 humanos alfa, 24 betas, 36 deltas, 48 gamas, 96 ipsilons e assim por diante... Aos menos numerosos caberá a inteligência e, como conseqüência disso, responsabilidades como a administração, o comando das ações, os estudos e o direcionamento do futuro da coletividade humana. Aos mais numerosos serão legadas as funções produtivas, ligadas ao trabalho mais físico e bruto, aquelas que permitem ao mundo alimentar-se, fruir-se e sobreviver. Para evitar sobressaltos e qualquer rebeldia pessoal ou revolução coletiva os homens terão acesso a uma boa qualidade de vida, independentemente de suas funções e da posição que ocupam na hierarquia. Também serão preparados nas linhas de produção em que são concebidos para terem cérebros mais ou menos desenvolvidos que não permitam o surgimento de focos de revolta entre os grupos mais populosos da sociedade. Outra grande preocupação para que o mundo seja realmente belo e perfeito passa por processos de “conscientização” coletiva realizados durante cada etapa da vida de todos os seres dessa sociedade admirável para que as pessoas se acomodem em seus destinos previamente traçados pelos gestores dos processos artificiais que regem o mundo. Como os cachorros de Pavlov, os seres humanos também serão condicionados... Tudo em nome da harmonia social, da realização coletiva, da paz que a todos traz prosperidade. Os sentimentos fúteis, como o amor, serão desnecessários e, por isso mesmo, acabarão varridos do mapa. Qualquer instabilidade ou dor de cabeça aparente poderá ser apaziguada a partir do uso de alguns estimulantes que permitirão aos usuários (constantemente condicionados pelo estado para a utilização dessa química) a mudança de astral para a felicidade perene, mesmo que artificialmente atingida. Todos serão de todos. Não haverá espaços para relacionamentos exclusivos entre um homem e uma mulher. Não poderão ser concebidos filhos a partir da intimidade entre um casal. Isso passa a ser considerado abominável... O sexo não será abolido. Pelo contrário, será estimulado e entendido como uma forma de tranqüilizar a população. Instados pelos ditames e pela ladainha oficial, as pessoas irão se relacionar dentro de seus grupos específicos de origem industrial. Aos demais seres com os quais coexistem reservarão apenas o tratamento profissional e polido que cada situação de contato irá requerer. Aldous Huxley escreveu na década de 1930 uma obra de ficção que parece cada dia mais atual e provocante. Seu público imediato, aquele dos primeiros 20 ou 30 anos depois da publicação desse livro, talvez tenha encarado seus medos e olhar intimista e pessimista quanto ao futuro da humanidade como apenas uma obra de ficção, fadada a perder o encanto e a visibilidade depois de algum tempo. Não sabiam que o autor não escrevia pensando apenas para o mundo em que viveu, mas principalmente para os homens do amanhã, de um futuro mais distante, que não contaria com a sua presença... Esses destinatários de sua mensagem somos nós...
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