A Contração e o Colapso do Universo
(Margaret Wertheim)
As leis da física newtoniana descreveram como os planetas giravam à volta dos sóis, e os satélites à volta de suas terras. Essas leis não tinham absolutamente nada a dizer sobre a história cosmológica. Enquanto as leis de Newton se calavam a respeito da Criação, o mesmo se fazia a observação empírica. Quando olhavam através de seus telescópios, os astrônomos do século XVIII não podiam ter nenhum vislumbre de uma história cosmológica, nenhuma percepção de um início ou mesmo de um fim. A visão que o telescópio lhes dava era de um universo aparentemente atemporal. Se Deus havia criado seu cosmo – do que o próprio Newton nunca duvidara –, então parecia ter feito o possível para apagar todos os traços do processo gerativo. O fato da ciência não ter sua própria história da Criação só veio facilitar sua harmonização com o Cristianismo. Podia-se concordar prontamente com Newton em que a divindade cristã havia feito o mundo e ao fazê-la incorporara nela as leis da física. Para os cristãos convictos do início do século XVIII, a falta de uma história cósmica na descrição científica do universo era na verdade fonte de satisfação: podia-se aceitar tanto a idéia cristã quanto a teoria de Newton. O lugar da história da Criação cristã emergiu da representação científica da estase cósmica: um universo sem começo ou fim, ele simplesmente é. Nesse quadro, o universo era sem história, um padrão atemporal eterno de astros que haviam perdurado, e iriam perdurar, para todo o sempre. No século XIX esse quadro estático arraigou-se tão profundamente nas mentes da maioria dos cientistas que, no início do século XX, a idéia de uma origem cósmica do universo tornara-se quase impensável nos círculos científicos. Essa concepção estática do cosmo foi estilhaçada por Edwin Hubble, que descobriu que as estrelas distantes estão se afastando de nós com velocidades imensas. As descobertas de Hubble iriam mudar para sempre nossa concepção do universo. O cosmo newtoniano era infinito, mas na prática, a maioria dos astrônomos acreditava que a Via Láctea era a totalidade do universo. Como o fio da lâmina de um verdugo, a linha do gráfico de Hubble cindiu o cosmo newtoniano estático. Em outras palavras, o que o gráfico de Hubble revelava era o fato assombroso de que o universo está se expandindo! A noção de um universo estático, atemporal, foi despedaçada. De repente se percebeu que todo cósmico é dinâmico. Da evidência da expansão cósmica decorria, portanto, a conclusão de que o universo teve um começo, uma pequena fase densa a partir de cuja explosão o vasto cosmo moderno se formou. Ninguém teria ficado mais surpreso que Hubble, que continuou inquieto com toda essa idéia até o fim de seus dias. Hubble e Hoyle não eram os únicos astrônomos incomodados com a idéia de um Big Bang. De início, muitos cientistas detestaram a idéia porque ela cheirava a religião. Se o universo tinha um começo, pensavam, devia ter tido um criador – o que seria anticientífico. O artífice dessa teoria, o físico alemão Albert Einstein, havia sido ele próprio tão dominado pela tradição da estase cósmica que também inicialmente resistiu à idéia de uma origem cósmica. Ele e outros não tardaram a compreender que as equações relativísticas previam um universo não estático. Então, a teoria especial da relatividade emergiu de uma penetrante crítica da idéia de espaço absoluto de Newton. Desde o início, o matemático Leibniz objetou que a idéia de espaço absoluto era um absurdo lógico. Opondo-se a Newton, sugeriu que espaço e tempo eram fenômenos relativos. Newton refutou essa visão engenhosa com todo o peso de sua autoridade, e com o de sua teologia, que associava o espaço absoluto a Deus. Como acreditava que Deus era absoluto, Newton insistiu que o espaço também devia sê-lo. Ao rejeitar a idéia de espaço absoluto, Einstein estava se lançando contra os titãs da ciência e da filosofia. Ali estava, na voz sóbria e clara da geometria, a afirmação de que o universo tivera um começo. Disso, surgiu sua teoria que, nos instante do big-bang, não só a matéria, mas também o espaço e o tempo havia “nascidos”. Sob quase todos os aspectos, o espaço relativístico geral é uma ruptura completa com relação ao passado newtoniano. Na representação de Einstein, o espaço é transformado de arena neutra em participante ativo do grande drama cosmológico. Na visão de Newton, o espaço era essencialmente uma caixa vazia. Na relatividade geral, portanto, a gravidade é apenas um subproduto do espaço curvo. Nessa visão, o espaço deixa de ser um pano de fundo inerte, torna-se um campo cosmológico – um substrato visceral do universo. Contudo, apesar das equações de Einstein e dos dados de observação de Hubble, no início muitos cientistas se opuseram à idéia de uma origem cósmica, que parecia suscitar o espectro de um Criador de estilo cristão. Até a década de 1970, ninguém fora capaz de provar definitivamente a necessidade de um big-bang. Stephen Hawking e Roger Penrose, finalmente demonstrou, usando a relatividade geral, de que num universo como o nosso, houve um momento inicial de coalescência cósmica. Por mais carregada que fosse o “estigma” da religião, a criação cósmica chegara para ficar. Os cálculos dos astrofísicos situam agora esse evento entre dez a quinze bilhões de nãos atrás.
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