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UM CASAMENTO
(NadiaDaher)

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Minha vizinha vai casar a filha... Isto, assim mesmo. Não é a filha que vai se casar. Ela vai ser casada. Não que ela não aceite ou se rebele, ou que não deseje isto e tenha outros planos. Tais coisas não fazem parte do repertório de nenhuma delas. As coisas funcionam bem assim: uma cadeia de matrimônios envolvendo patrimônios.
Na minha rua, carrões importados reluzem. O buffet vindo de longe descarrega caixas, travessas, cristais e prataria. Garrafas de wisky, vinhos raros, doces finíssimos... Não, não tenho nada contra a riqueza e a ostentação não me incomoda. Fico ali parada olhando tudo se desenrolar como num filme: os risos, as vozes ecoando pela rua fervilhante. E vejo num relance uma meninazinha de dois anos, muito séria, a arrastar pela mão uma enorme boneca que não conseguia carregar. Depois a vejo crescida, chorando para sair com as amiguinhas, em vão, naturalmente. Anos mais tarde apareceu o primeiro namorado, um garoto da vizinhança, que foi rechaçado e expulso da casa. A vi ser arrastada pelos cabelos sem um gemido, diante de toda a vizinhança. Não, aquilo não era conveniente. Ela era uma princesa, merecia mais, muito mais.
Karine chegou à porta e me sorriu. Sorri de volta, trazida à realidade por aquele sorriso que vi quase todos os dias nos últimos dezessete anos. Sim. Eu amava aquela menina e seu sorriso lindo, seu olhar sério, sua voz baixa. Eu amava sua meiguice e doçura, tanto, que me perguntava se eu não devia falar com ela naquele momento... Explicar que se casar com um rapaz estranho somente porque a família era muito, muito rica e amiga da sua, não fazia nenhum sentido nos dias de hoje. Que era preciso amor, desejo, paixão para se construir uma vida em comum... Mas, será que era mesmo? Para ela, criada dentro de valores tão diferentes dos meus, onde possuir jóias e fazer viagens incríveis era o ponto alto e culminante da vida, onde o burburinho das festas, o brilho dos vestidos, as conversas amenas simbolizavam a própria existência, naquilo que ela possuía de melhor, seria mesmo assim?
Se no lugar da sua Mercedes prata, seus vestidos caríssimos e cruzeiros pela Grécia ela tivesse que viver do seu salário de professora, como eu mesma, lutando a cada dia por algo mais forte que o cotidiano, estudando sempre, descobrindo fórmulas de crescer mais como pessoa, seria feliz?
Seria realizada como mulher ao estar casada com o amor de sua vida, que veria chegar todos os dias de seu emprego de engenheiro, cansado, mal humorado, suado. .. assim como eu via chegar o meu marido, meu amor, agora careca e desleixado?
Que prazeres ela tiraria de um cotidiano como o nosso? Nossos amigos fiéis que se reuniam alegremente em torno de um vídeo, assistindo a um filme, comendo pipoca e tomando cerveja, só para discutir depois o que cada um apreendeu do mesmo? A simples companhia, a alegria do encontro, a valorização das pequenas coisas simples, que sentido teria para minha pequena Karine?
Ela me acenou para entrar. Sorri e respondi que já iria. Sim, eu entraria naquela casa, naquela festa, com minhas melhores intenções de compreender o mundo dela, o mundo festivo daquela gente alegre, rica e despreocupadamente inconsciente da cara suja da vida, lambuzada de terra, comida estragada, lixo. Não cabia a eles salvar o planeta. Eles não eram os doces bárbaros, eram a nata nutritiva sobre o leite muitas vezes azedo.
Abracei minha menina, seu encantador sorriso me envolveu inteira e me calei sobre minhas conjecturas de que a riqueza por si só não fazia sentido. Não para mim, mas para ela, para pessoas que como ela cresceram fazendo piqueniques sobre a lama dos parques, fazia todo o sentido. Sim, ela seria feliz. Teria uma casa linda num condomínio fechado. Dois carros enormes. Dois ou três filhos saudáveis. Jogaria nos cassinos turísticos da vida, esquiaria na neve, dançaria nos bailes mais requint



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