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O Bigode
(Emmanuel Carrère; Herbert Daniel (tradutor))

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Todos têm um bigode, só não sabem

No filme O Bigode (La Moustache – França, 2005) o telespectador se vê frente a frente com um dos maiores problemas existenciais da humanidade: a história de Marc, um cara que raspa o bigode. Ok, talvez este não seja lá um grande problema existencial da humanidade. Não seria, se depois de raspar o bigode ninguém, nem a esposa de Marc, Agnès, notassem a mudança. A partir daí, acompanhamos Marc tentando entender o que ocorre à sua volta: será uma das brincadeiras articuladas pela esposa, com amigos e colegas de trabalho? Marc deve acreditar quando ela diz que ele nunca usou bigode? Como reagir quando não só os amigos e colegas de trabalho mas até o garçom do café da esquina não notam diferença alguma? Marc procura desesperadamente justificar o injustificável: se não for uma brincadeira de mau gosto dos seus conhecidos, seria algum bug no Universo que só ele notou? Ou pior, estaria a esposa e o sócio tentando fazê-lo agir como louco para tomar tudo dele? São hipóteses razoáveis levantadas mas que, ao final, serão irrelevantes.

É certo que os relacionamentos exigem certa dose de tolerância para com os defeitos do parceiro. Mas o que fazer quando estes defeitos se voltam contra quem os tolera? Agnès era uma excelente mentirosa. Pregava peças nos amigos e, mesmo que a mentira parecesse óbvia, negava tão convictamente que os enganados passavam a considerar outras hipóteses, mesmo as mais absurdas. Mas em cinco anos de casamento, Marc sempre assumiu o papel de cúmplice, nunca o de vítima. Aquela brincadeira seria a primeira traição de Agnès e isso machucava Marc.

A trama evolui ao ponto em que ora Marc acredita – e nos leva junto – que ele é quem está louco e por isso faz sofrer a amada, para momentos depois concluir que ela é quem enlouqueceu e deve ser tratada com cuidado e amor. Carrère leva o choque de relacionamentos ao extremo: o quanto alguém estaria disposto a amar quem não acredita nele? Ou como seria possível amarmos sem acreditar na pessoa?

E o livro? Digamos que é a versão hard do filme. Seria impossível Carrère passar para a tela todo o terror mostrado no livro. Eu não me chocava com um parágrafo final tão tenso e surreal desde Os Trabalhadores do Mar de Victor Hugo, outro francês por sinal. O livro O Bigode poderia dividir-se em duas partes: quando Marc é sugado pelo redemoinho sem conseguir se livrar dele, e outra quando já está no fundo, e o redemoinho o cospe para fora. Ambas situações brutais para o protagonista. Carrère desconstrói a vida do personagem pouco a pouco, assim como a lógica, a sanidade e a linearidade, para depois construir tudo de novo, de um jeito diferente, como em um quadro que mostra duas paisagens distintas, dependendo do ângulo do observador.

Pode-se dizer que a essência da história focaliza a questão da individualidade. Nos subterfúgios e nas comparações usadas para justificar quem somos e porque somos assim. Todos se alicerçam em algum objeto, pessoa ou idéia para se definir como pessoa e usa referenciais para explicar porque é assim ou assado. Mas o que acontece quando um destes pontos de apoio simplesmente desaparece? Quando a verdade em que se acredita cegamente revela-se uma fraude? Ou quando alguém que é a razão do seu viver não existe mais? Esta base em que alguém se apóia pode ser para um, o bigode, para outros a carreira, um desejo, um ideal ou uma pessoa. Como reagiríamos se nos tirassem o que ou quem nos é mais importante hoje? Carrère usa uma situação extrema para provocar a reflexão em coisas corriqueiras: o ser, os relacionamentos, a lucidez e a realidade. E o faz de maneira genialmente original.



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