Enigma de uma Vida
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Drama psicológico. Um ano após
ter perdido contato, Ned Merrill reaparece na mansão de um casal de amigos. É
domingo de verão, e todos estão ao redor da piscina, sob o sol. Comentam a
festa da noite anterior e recordam os bons tempos, quando Ned, em forma apesar
da meia idade, tem a súbita ideia de fazer o caminho de retorno à sua residência
através da visita a todas as piscinas da região, descendo o vale como se
nadando num longo rio, com intervalos por campos e bosques. Tem início, assim,
uma jornada que, fora o esforço físico, trará para o bon vivant Ned inesperadas lembranças e revelações.
Como a história de Ned, este Enigma de uma Vida (The Swimmer, EUA, 1968) começa parecendo uma coisa para revelar-se
outra. Se no início os diálogos superficiais e as soluções visuais quase cafonas
do diretor Frank Perry (segundo o IMDB, Sydney Pollack, não creditado, também
teria colaborado na direção) levam o espectador menos paciente à sensação de desperdício
de tempo, aquele que se dispor a acompanhar o caminho entre piscinas do
protagonista será premiado com uma boa história sobre egoísmo e
irresponsabilidade.
O roteiro de Eleanor Perry,
baseado em argumento de John Cheever, vai aos poucos se erguendo sobre
alicerces à primeira vista pouco estáveis, com sequências longas de eficácia
duvidosa como a de Ned e da ninfeta Julie Ann, sorrindo e pulando em câmera
lenta sobre obstáculos, debaixo de uma pomposa trilha sonora composta por
Marvin Hamlisch. Cenas como esta, e a da corrida de Ned com um cavalo, vão, no
entanto, se revelando como amostras da luta pela permanência de um tempo que já
se foi, e que aos olhos do protagonista continuam no presente. A exacerbada virilidade,
demonstrada não apenas nestes momentos, mas também nos avanços sobre o sexo
oposto (e na própria empreitada de percorrer a longa distância correndo,
andando e nadando), somada à incapacidade de reconhecer os próprios erros vão
sugerindo, nos acréscimos de detalhes, a imaturidade que não admite o fracasso,
até o lamento próximo ao final: “Nada saiu do jeito que eu pensava”.
Para manter aceso o interesse do
espectador, o bom roteiro mistura momentos e personagens curiosos com pequenas
e incompletas informações sobre o passado de Ned. É assim na terceira mansão
visitada por ele, onde não é bem vindo, ou na do casal de velhinhos nudistas,
ou ainda na residência dos Gillmartin, onde encontra apenas uma criança e uma
piscina sem água. A descida do vale torna-se, assim, uma descida aos infernos
da realidade, que vem à tona nas humilhações sofridas no clube, na festa dos
Biswangers e na última visita, a um romance do passado. A realidade, até então
escondida, disfarçada e renegada, impõe-se e obriga o protagonista a olhá-la de
frente.
Num rico desempenho que acompanha
as mudanças do roteiro, Burt Lancaster (que atravessa o filme trajando apenas
um sungão azul), aos poucos substitui a pose de galã fútil, sensual e
sorridente pela surpresa, pela indignação, pela derrota e pelo desespero. Não
se vive, se gasta, se ama, impunemente. Em algum momento a vida envia a conta.
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