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O Bom Selvagem
(Rodrigo Constantino)

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A análise de uma idéia deve ser objetiva, caso contrário, podemos
incorrer no risco de argumento ad hominem, desqualificando o autor da idéia em
vez dela em si. Em certos casos, porém, podemos abrir uma exceção para julgarmos
quem defendeu certa coisa, se esse estudo nos ajudar a melhor compreender sua
lógica. Foi o que fez o historiador Paul Johson em Os Intelectuais, que começa
a investigação sobre esse grupo de pensadores com Jean-Jacques Rousseau,
considerado o primeiro dos intelectuais modernos, além do mais influente de
todos.

Rousseau popularizou o culto da natureza, identificando e apontando a
artificialidade da civilização. Uma de suas idéias mais famosas, a do “homem
bom” no estado natural, depois corrompido pela sociedade, já parte de uma certa

contradição, já que a sociedade é justamente formada por esses mesmos “homens
bons”. Isso não o impediu de idealizar o homem, imaginando como ele deveria
ser, mas ignorando como ele de fato é. Rousseau passou a considerar a
competitividade um pecado que destrói o senso comunitário inato ao homem,
estimulando suas características mais perversas, incluindo o desejo de
exploração. Ele desconfiava da propriedade privada, julgando-a a causa da
criminalidade social. Marx iria explorar sem limites tal idéia, com conseqüências
terríveis. E não deixa de ser curioso que as tribos à parte da civilização, os
bárbaros, costumavam mostrar doses bem mais cavalares de violência uns com os
outros. Foi justamente o aumento das trocas voluntárias, calcadas no direito de
propriedade privada, que permitiu um progresso pacífico jamais visto antes pela
humanidade.

As idéias de Rousseau eram pregadas em tom messiânico, e ele se autoproclamava
o mais virtuoso dos homens. Sentia-se bastante diferente dos demais, e
considerava sua situação singular, “sem precedente desde o início dos tempos”.
Costumava apelar para a autocomiseração em busca de atenção, alimentando um
egoísmo exagerado. Ele se dizia amigo de toda a humanidade, porém, desenvolveu
forte predisposição para brigar com seres humanos em particular. Colecionou uma
lista de inimigos e desafetos, vários desses considerados grandes amigos antes.
Como dizia Nelson Rodrigues, “amar a humanidade é fácil; difícil é amar o
próximo”.

Conscientemente ou não, ele era bastante habilidoso em se autopromover. Atraía
bastante atenção para si, fosse através de suas brigas ou de suas
excentricidades.
Sua base de negociação com as pessoas era simples: elas davam, ele recebia.



Grande parte da reputação de Rousseau se deve a suas teorias sobre a educação
das crianças. Mas o relevante é sabermos como ele realmente agia no que diz
respeito ao tema. Quando sua mulher deu à luz ao primeiro filho, Rousseau a
convenceu de abandoná-lo, para que “a sua honra fosse salva”. A criança foi
colocada em uma trouxa e levada para o Hospital das Crianças Encontradas.
Outros quatro filhos tiveram o mesmo destino depois. Rousseau passou então a
transferir para o Estado a responsabilidade da paternidade, inspirado na
República de Platão. Sua tentativa de se autojustificar, num comportamento anormal,
levaria à proposição de um Estado paternalista ao extremo. Como Paul Johson
coloca, “graças a uma lógica infame, a perversidade de Rousseau como pai estava
ligada a sua conseqüência ideológica futura: o Estado totalitário”.

A defesa de um contrato social, calcado na Vontade Geral à qual todos
obedeceriam por convenção, transformaria indivíduos em filhos do orfanato
paterno, o Estado. Rousseau confessava ter um “certo ressentimento em relação
aos ricos e bem-sucedidos, como se a riqueza e felicidade deles tivessem sido
alcançadas à minha custa”. A inveja é outro ingrediente nos sentimentos que
levaram Rousseau à defesa de um modelo de “centralismo democrático”, similar ao
imposto por Lênin posteriormente, com catastróficos resultados. Caberia ao
Estado o controle até mesmo do pensamentoindividual, tudo em prol do conjunto
da comunidade. Temos em Rousseau um ícone do coletivismo perverso que
transforma indivíduos em meios sacrificáveis para outros fins.

O caráter verdadeiro de Rousseau não passou totalmente despercebido por outros
filósofos, apesar de sua dissimulação toda. Hume descreveu-o como um “monstro
que se via como o único ser importante do universo”. Diderot considerou-o um
“enganador, vaidoso como Satã, mal-agradecido, cruel, hipócrita e cheio de
maldade”. Estes foram pessoas próximas e amigos dele. Para Voltaire, ele era
“um poço de presunção e vileza”. Sophie d’Houdetot, quem ele mesmo considerou
seu único amor, julgou-o, quando mais velha, como “repulsivo”, uma “figura
patética” e um “louco interessante”. Não foram poucos os relacionamentos
destruídos por Rousseau ao longo de sua vida.

A história da vida de Rousseau poderia servir apenas para nos despertar pena,
pois tratava-se claramente de um ser desequilibrado. Entretanto, idéias têm
conseqüências, assim como mitos. Não obstante o absurdo de grande parte de suas

idéias, o mito Rousseau exerce influência até os dias de hoje, principalmente
na esquerda mais romântica. As idéias de Rousseau muito contribuíram para o
surgimento de Robespierre, que o considerava o “professor da humanidade”. Os
sangrentos anos de terror da Revolução Francesa merecem uma boa parcela de
culpa deste pretensioso reformador.

Em vez do mundo voltar sua atenção para a verdadeira revolução, que ocorria nos

Estados Unidos através das idéias infinitamente mais sensatas dos seus “pais
fundadores”, eram as idéias de Rousseau que ainda despertavam fortes emoções,
encontrando eco nos corações de muitos sonhadores. Para Kant, Rousseau tinha
“uma sensibilidade espiritual de inigualável perfeição”. Parece espantoso que
pessoas de tal gabarito ainda viam Rousseau desta forma idílica. A realidade é
bem diferente, como Paul Johnson. O defensor do “bom selvagem”, tinha muito
mais de selvagem que de bom.



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