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Geografia Sentimental (Aquilino, com Kant)
(Aquilino Ribeiro)

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A ontologia, como primado da existência sobre a essência, não interessa aqui e agora para nada. O que é que nós sabemos? Sabemos que pensamos que sentimos que pensamos. Assim, o mesmo é pensar e sentir e vice-versa. O sentimento estético, que é o que aqui nos ocupa o pensamento, foi intuído por Kant, em especial na Crítica da Faculdade de Julgar . Aquilino Ribeiro é um pensador da estética da natureza. Não será arriscado afirmá-lo. E, a juntar ao sentimento/pensamento humano do bicho-homem, Aquilino integra os bichos-bichos (e até os bichos-plantas ), como seres de sentimentos, logo de pensamentos: “Quando se passa à vista dessas serranias, perfiladas no horizonte, que têm o seu quê das monticulações dos formigueiros, cheias de povos, de passaredo, de bicheza humana e montesinha, toma-nos, da projecção de nossa pequenez sobre a imensidade e o mistério da distância, um sentimento que tanto pode ser de exaltar como de deprimir.” Dizia Kant que quem nos rouba a palavra, rouba-nos o pensamento. De facto, a sua capacidade de comunicar é a possibilidade que temos, ainda hoje, de tentar compreender o seu pensamento. Assim se passa com os escritores, assim se passa com Aquilino. A linguagem é o oxigénio da natureza. Seja através de sinais sonoros, visuais ou outros, seja através da palavra articulada, tudo na natureza é comunicante. Em Kant, afirma-se o primado da natureza sobre a arte e da beleza natural sobre a beleza artística. Em Aquilino, também: “De resto, a Primavera é uma pintora inigualável, enciclopédica, senhora de uma paleta que está ainda para nascer o grupo impressionista ou o laboratório de croma capaz de a suplantar.” Kant afirma, na Crítica da Faculdade de Julgar : “Tomar interesse imediato pela beleza da natureza é sempre sinal de boa alma; e se este interesse é habitual, pelo menos indica uma disposição do ânimo favorável ao sentimento moral, se de bom grado se associa à contemplação da natureza.” Em Aquilino Ribeiro, o sentimento estético e o sentimento ético não se confundem, mas comungam da mesma malga: o amor pela natureza. Diz Urbano Tavares Rodrigues em O Génio de Aquilino , que Aquilino Ribeiro “é livre-pensador e anticlerical, mas uma irreprimível atracção o faz abeirar-se dos franciscanos. Percebe-se. A religião deles é de amor, não de castigo e, pobre de teorética, abre-se toda para a natureza.” Não se pretende aqui acentuar as semelhanças entre Kant e Aquilino Ribeiro. Kant foi filósofo, Aquilino foi um homem de letras, um romancista, um contador de histórias. O que há em comum é o respeito pela natureza e pelos homens, dignificados por um sentimento estético, proporcionado por um favor da natureza. A filosofia de vida também terá pontos em comum. Mas o que parece uni-los como a água ao copo, é a intuição do pensamento como sentimento. E, neste, a nobreza do sentimento estético. Porquê Aquilino? Porque é um escritor português, do século XX; porque é uma esperança, de que o estético venha a prevalecer simplesmente por aquilo que é – um desinteresse interessado, um sentimento pensado, uma forma digna de vida. Para Aquilino, a natureza vale pelo que sente, pelo que dá e pelo que merece. O homem, para ser homem, tem de (se) merecer tamanha dádiva. Em Kant, o sentimento estético permite pensar a natureza como teleologia. O mesmo nos diz a prosa poética de Aquilino Ribeiro: “Dado que pudéssemos medir o mundo por outra toeza, outro galo nos cantara. Mas a nossa insignificância exige precisamente esta pessoalidade de comensuração, donde resulta que a Primavera, por exemplo, não é um fenómeno com a sua ciclicidade de todo independente do indivíduo, mas uma forma do seu estado de ser. As rosas têm mais ou menos perfume conforme o momento de sensibilidade de quem as aspira. O prado de um proprietário é sempre mais bonito que o prado do vizinho. (…) Se o homem tivesse olhos, como asmáquinas fotográficas, puramente objectivos, gozaria por certo o mundo de forma invariável, um só tom, uma só forma, uma só gama. Todavia é na diversidade da retina que reside a ciência: o bem e o mal. Uniforme só o olhar dos anjos.” Que valor para a filosofia, enquanto estética da natureza? E que natureza, como objecto ou paradigma estético? Será este um (ou o) caminho para salvar a natureza e a relação do homem com ela? A escolha de Aquilino Ribeiro tem sobretudo a ver com as possibilidades de resposta a questões como esta. Penso que não foi em vão. Ficou guardado para um fim um dos trechos mais refrescantes da Geografia Sentimental: “A existência de um depende do excídio de outros. Esta ciclicidade da vida e da morte poderia fazer desesperar da nossa condição de viventes, se nos puséssemos a filosofar. Quem se dá ainda a tão fútil passatempo?”



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