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Isto pode ser correcto na teoria, mas nada vale na prática (em A Paz Perpétua...) - I
(Kant)

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1. Teoria e prática. Como introdução ou exercício teórico preliminar, Kant lança as bases para um texto de esclarecimento acerca das relações entre a teoria e a prática. Trata-se de expor os instrumentos de trabalho: as definições de teoria e prática.
O que é a teoria e o que está no seu âmbito? Regras práticas. Regras para pôr em prática, para aplicar, para exercitar. Para serem de âmbito teórico, elas devem ser pensadas como princípios universais, ou seja, independentemente das condições de aplicação, embora necessariamente influenciadas por elas (de acordo com elas).
Quanto à prática, atenção à advertência de Kant (deveremos abordar este assunto mais tarde, nomeadamente aquando da comparação entre prática e práticas - ou a prática como habilidade), logo no início do texto: a prática (que interessa ao filósofo) não é qualquer tipo de operação, mas tão só a que é executada de acordo com os princípios teóricos para ela representados.
A relação entre a teoria e a prática consubstancia-se num acto da faculdade de julgar. É um acto de liberdade que funde teoria e prática em praxis: “O ajuizamento teórico das acções chama-se a praxis, em oposição à ciência teórica onde não [é] o comportamento livre dos homens [que] está como objecto.” Sendo livre, a faculdade de julgar é um juízo que não se sujeita a regras; pelo contrário, é um juízo fundador de regras.
Temos aqui uma pescadinha de rabo na boca: a faculdade de julgar une teoria e prática ao consumar as acções de acordo com o preceito teórico, universal e abstracto. Simultaneamente, a faculdade de julgar é a sede de criação das regras (leis) universais. Porquê? Porque é uma faculdade da razão. Por isso, adverte Kant, a prática não se resume à mera aplicação das regras. E também por isso, diz-nos o filósofo que um bom teórico não é, necessariamente, um bom prático.
É que o exercício da liberdade é uma tarefa árdua, senão a mais complicada que o homem enfrenta pelo simples facto de se apresentar ao mundo. Leia-se o que diz o pensador Ernst Cassirer: “Segundo Kant liberdade é equivalente a autonomia. (…) Isso significa que a lei à qual nós obedecemos nas nossas acções não é imposta do exterior, mas que o sujeito moral dá a si próprio esta lei (…); não é uma dádiva com a qual a natureza humana está dotada; mas é antes uma tarefa, e a mais árdua tarefa que o homem poderá estabelecer para si próprio.” Por outro lado, a teoria adquirida poderá não ter sido a bastante para uma aplicação prática integralmente satisfatória.
Daí conclui claramente Kant que a prática desligada da teoria é uma falsa prática e que é necessária ainda a unidade a que o filósofo dá o nome de sistema – trata-se da unidade prática (porque do reino das acções), só conseguida pela faculdade de julgar (que não é uma faculdade natural mas trabalhada, exercitada).
Assim, podemos afirmar com mais segurança o primado da razão prática, em Kant, em termos de acto fundador pela razão, e, simultaneamente, reafirmar a absoluta necessidade teórica, como princípio regulador da acção.
O verdadeiro primado é o da unificação, não a teoria ou a prática, mas a praxis, ou seja, a adequação dos meios aos fins, em liberdade.
2. Uma teoria que se funda no conceito de dever. Ao falar de um acto de liberdade, Kant remete-nos para a esfera da moralidade. Este é um dado importante, uma vez que, e atendendo a que ainda estamos na introdução ao opúsculo, se parte do princípio que em qualquer esfera do real, o ajuizamento prático é sempre da ordem da moralidade. Logo, a moral é (deve ser) soberana sobre qualquer acção humana.
É neste sentido que Kant vai apresentar as provas da imprescindibilidade da teoria em relação à prática. A primeira prova surge com as primeiras palavras de explicitação do conceito de dever. Kant critica os que consideram a teoria como um conceito vazio, sem valor para a prática, uma vez que não se firma em experiências acumuladas, essas sim, no entender dos pseudo-sábios, as verdadeiras bases de conhecimento e progresso da humanidade.
A prova apresentada por Kant é a da evidência. Tudo estaria certo se, em vez de toupeiras, não estivéssemos a lidar com “um ser que fora feito para se manter de pé e contemplar o céu.”
Na verdade, o tema principal deste opúsculo de Kant é a subsunção das leis do direito nas leis morais, através da mediação da faculdade de julgar, em liberdade. Kant, uma linhas à frente, afirma mesmo a coincidência entre dever de virtude ou de direito. No campo do direito, é mais premente que a prática se coadune inteiramente com a teoria. Porquê? Porque ao contrariar os princípios universais que a regem, a prática destrói a teoria e os fundamentos da sua própria aplicabilidade. O homem fica desprovido de leis orientadoras do seu fazer e do seu agir. Voltaríamos ao estado de natureza hobbesiano…



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