A ordem do discurso
(Michel Foucault)
O trabalho de Foucault tem influenciado o pensamento em muitos campos da teoria social, principalmente da educação. Um dos principais desafios foucaultianos é a visão de que a verdade e o poder estão mutuamente interligados, através de práticas contextualmente específicas, que por sua vez, estão intimamente intrincados à produção do discurso, que é regulado, selecionado, organizado e redistribuído, reunindo poderes e perigos em qualquer sociedade, existindo relações de classes que implicam em determinadas posições políticas e ideológicas que, por sua vez, incluem formações discursivas atuantes entre si, e que determinam o que pode e o que deve ser dito -principalmente no âmbito da política e da sexualidade – campos sociais onde o discurso é mais controlado. “ Não se tem o direito de dizer tudo, não se pode falar tudo em qualquer circunstância, qualquer um não pode falar de qualquer coisa ”. Por mais que o discurso aparente ser bem pouca coisa, as interdições que o atingem, revelam logo sua ligação com o desejo e o poder.
Indivíduos considerados loucos pela sociedade – justamente por não dizerem o esperado – expõe seu discurso, porém, a palavra do louco não é e nunca foi ouvida, porém, quando escutada, é tida como uma palavra de verdade (uma verdade que os indivíduos normais não percebem). O louco é aquele sujeito cujo discurso é impedido de circular como o dos outros. Foucault chama a atenção para aspectos da verdade; usados como forma de controlar e regular a sociedade. Ao conceituar poder e saber, ele se foge das definições convencionais, cujo poder pode funcionar negativamente, distorcendo a verdade e com isso desafiando a dominação do poder opressor. Essa forma de “ameaça” se dá através do saber, que pode ser encarado como contra-ataque aos males provocados por ele.
No decorrer do seu discurso, Foucault faz uma indagação: “Mas afinal, onde está o perigo de as pessoas falarem e de seus discursos proliferarem indefinidamente?” Através desse questionamento, ele nos leva a refletir sobre os discursos que estão em pauta no cotidiano, na atualidade; principalmente nas salas de aula. Que tipo de discurso é ouvido, é falado ou é melhor repetido? Sob essa perspectiva, o perigo estaria na submissão às regras que constituem a formação do discurso, podendo reduzi-lo apenas a um elemento do poder. Assim, a sociedade se torna disciplinada através da linguagem dos discursos que se proliferam indefinidamente. Visto por esse ângulo, o poder torna-se mascarado e não sabemos, na verdade, onde ele está. Um discurso libertador pode se tornar opressor. Os indivíduos vão apreendendo idéias e valores em nome de um discurso proferido como válido pelas famílias, pelas instituições ( principalmente as escolares ). Dessa forma, esses discursos pretendem ditar ao homem o papel que ele precisa desempenhar na sociedade. Percebe-se um alerta de Foucault, levantando alternativas sobre a visão de homem que reina no mundo, e que o discurso coercivo e universal, coloca o homem numa trilha, que funciona como o caminho da verdade, ou seja, o caminho que deve ser seguido e interessa ao poder. Nesse sentido, o discurso camufla a verdade e a que prevalece é a do indivíduo que detém o poder.
Outra menção feita por ele é sobre as “sociedades do discurso”, cuja função era conservar e reproduzir os discursos, permitindo que eles circulassem apenas dentro de um espaço fechado e regido por regras estritas. O número de indivíduos que falavam era limitado. Só entre eles era permitido que o discurso fosse transmitido. Mesmo não existindo mais essas sociedades, Foucault faz um alerta: “Ninguém se deixe enganar; mesmo na ordem do discurso verdadeiro, mesmo na ordem do discurso publicado e livre de qualquer ritual, se exercem ainda formas de apropriação de segredo e de não-permutabilidade.”
É possível que o ato de escrever institucionalizado nos livros – no sistema de edição e no personagem do escritor - tenha um lugar na “sociedade do discurso”, mas certamente de forma coercitiva.
Considerando os pontos abordados por Foucault em A Ordem do Discurso, percebe-se a importância de uma leitura mais consciente e reflexiva do mesmo, principalmente para os educadores, que de certa forma, estão autorizados a falar. Sabendo-se analisar as relações de poder-saber veiculadas na sociedade, é possível identificar as características e práticas particulares que têm efeitos perigosos, dominadores ou negativos.
Ter um novo olhar para as engrenagens das instituições educacionais, questionar a verdade dos discursos - inclusive os próprios – pode abrir possibilidades de mudança na prática educativa.
Finalizando e retomando o início do discurso, Foucault diz: “ ... É preciso continuar, é preciso pronunciar palavras enquanto as há, é preciso dizê-las até que elas me encontrem, até que elas me digam – estranho castigo, estranha falta, é preciso continuar, talvez já tenha acontecido, talvez já tenham dito, talvez me tenham levado ao limiar de minha história, diante da porta que se abre sobre minha história, eu me surpreenderia se ela se abrisse.”
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