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O Conto da Ilha Desconhecida
(José Saramago)

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Um HOMEM foi bater à porta do REI e disse-lhe: “Dá-me um barco”. A casa do rei tinha muitas portas, mas aquela era a das petições. Como o rei passava todo o tempo sentado à Porta dos Obséquios (entenda-se, os obséquios que faziam a ele), cada vez que ouvia alguém chamando à Porta das Petições fingia-se desentendido. Como o HOMEM não parava de bater e começava a chamar a atenção da vizinhança, o REI mandou seu PRIMEIRO-AJUDANTE resolver o problema. Este mandou o SEGUNDO-AJUDANTE e assim foi até chegar à MULHER DA LIMPEZA. Ela, como não tinha ninguém a quem mandar, abriu uma fresta da porta e perguntou o que o HOMEM queria. O HOMEM disse que só falaria com o REI em pessoa e deitou-se em frente à porta, impedindo a passagem de outros súditos que queriam fazer pedidos.
Sabendo da teimosia do HOMEM, o rei mandou abrir a porta. “Dá-me um barco.”, disse o HOMEM simplesmente, “Para ir à procura da ilha desconhecida”. Como já não existem mais ilhas desconhecidas no mundo, o REI julgou que estivesse diante de um louco, desses que têm mania de navegações. Mas o HOMEM insistiu. Disse que as ilhas que estão no mapa são as já conhecidas. Quanto à “ilha desconhecida”, essa não poderia estar em mapa nenhum. Persuasivo, o HOMEM disse que não queria dinheiro nem tripulação. Apenas um barco. E afirmou também que, quando descobrisse a ilha, ela seria só dele. Ao REI, só interessavam as ilhas conhecidas.
O REI ficou bravo com o HOMEM e chamou a guarda. Mas a multidão, lá fora, começou a gritar, exigindo que o HOMEM ganhasse o seu barco. O rei cedeu e concordou com o pedido.
Enquanto o HOMEM seguia para o porto para tomar posse do seu barco, a MULHER DA LIMPEZA saiu do palácio por uma porta raramente usada: a Porta das Decisões. Apresentou-se ao HOMEM e disse que seria a encarregada da limpeza no barco. Queria ir com ele atrás da ilha desconhecida.
Ao chegar ao porto, o HOMEM encontrou o CAPITÃO dos portos. Este também tentou demovê-lo de seu intento, afirmando, como o REI, que já não haviam ilhas desconhecidas. Depois, diante da teimosia do HOMEM, entregou-lhe o barco, como exigia o REI. Era uma bela e frágil caravela.
Enquanto o HOMEM saiu caminhando para recrutar a tripulação, A MULHER DA LIMPEZA ficou no barco, varrendo e limpando. As gaivotas tentaram atacá-la e expulsá-la, mas ela girou a vassoura no ar e as expulsou. Quando o HOMEM voltou, trazia um embrulho de comida na mão, mas estava sozinho e cabisbaixo. Nenhum marinheiro quis acompanhá-los naquela loucura. Também eles estavam certos de que já não haviam mais ilhas desconhecidas. Por que largariam o sossego dos seus lares e a boa vida dos barcos de carreira para se meterem em aventuras oceânicas, à procura do impossível?
A MULHER DA LIMPEZA não se deixou abater. Como não tinham tripulação, propôs o seguinte: eles podiam morar ali no barco. Ela ganharia dinheiro fazendo faxina em outras embarcações. Segundo o FILÓSOFO DO REI, que às vezes conversava com ela, todo homem é uma ilha. Mas o HOMEM achava que era necessário sair da ilha para ver a verdadeira ilha, que não nos vemos se não saímos de nós.
O HOMEM e a MULHER deram uma volta para conhecer o barco. Acharam a caravela transformada bonita, mas o HOMEM percebeu, que sem tripulantes, não conseguiria manobrá-la. Teria que devolvê-la ao rei. A MULHER discordou. Não achou certo que ele perdesse o ânimo à primeira contrariedade. Estava convencida de que poderiam se arranjar só os dois.
Os dois comeram e tomaram vinho sob a luz da lua e o HOMEM percebeu o quanto aquela mulher era bonita. Depois foram dormir cada um numa ponta do barco. Ele sonhou durante toda a noite. Sonhou que a sua caravela ia pelo mar alto, com as três velas triangulares enfunadas, abrindo caminho sobre as ondas, enquanto ele manejava a roda do leme e a tripulação descansava à sombra. Do porão do barco, começaram a vir sons de animais de todos os tipos. Depois choveu e, no convés, brotaram plantas de todas as qualidades. O HOMEM, ali do leme, perguntou aosmarinheiros se eles já avistavam alguma ilha desabitada, mas eles responderam que não. Que a ilha desconhecida não existia e que queriam ficar no próximo porto. Foi exatamente o que aconteceu: assim que o barco aportou, todos se foram, levando todos os animais. Por causa do atropelo da saída haviam-se rompido e derramado vários sacos de terra, de modo que a coberta era toda como um campo lavrado e semeado. Logo uma floresta navegava e balançava sobre as ondas, uma floresta onde começavam a cantar os pássaros.
Então o HOMEM trancou a roda do leme e desceu ao campo com a foice na mão, e foi quando tinha cortado as primeiras espigas que viu uma sombra ao lado da sua sombra. Acordou abraçado à MULHER DA LIMPEZA, e ela a ele, confundidos os corpos, confundidos os beliches, que não se sabe se este é o de bombordo ou o de estibordo.
Depois, mal o sol acabou de nascer, o HOMEM e a MULHER foram pintar na proa do barco, de um lado e do outro, em letras brancas, o nome que ainda faltava dar à caravela. Pela hora do meio-dia, com a maré, A Ilha Desconhecida fez-se enfim ao mar, à procura de si mesma.



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