Educação e Socialização em Max Weber
(Wania R. C. Gonzales)
É através do processo de socialização que os indivíduos são preparados para participar dos sistemas sociais a partir da compreensão dos símbolos, dos sistemas de idéias, da linguagem e das relações que constituem os referidos sistemas. Esses elementos são aceitos pelos indivíduos como sendo naturais (JOHNSON, 1997).
A socialização é um processo permanente na vida dos indivíduos – tanto no momento em que esses adquirem novos papéis na vida social como quando eles se ajustam à perda de papéis sociais antigos. É por meio do processo de socialização que os sistemas sociais se perpetuam e funcionam eficazmente, na medida em que os indivíduos desempenham os seus papéis sociais mediante a incorporação de valores e padrões sociais vigentes numa determinada sociedade.
A educação é um dos vastos campos dos processos de socialização, mas, na teoria sociológica de Weber, há uma confluência dos dois termos, porque o autor não a restringe à instrução, à instituição escolar. Com essa abordagem, Weber conseguiu compreender a especificidade dos diferentes sistemas educacionais. Contribuiu, também, para incrementar as abordagens dos sociólogos da educação ao focalizar os diferentes sistemas que desenvolvem a socialização dos indivíduos.
Dessa forma, o autor examinou o processo educativo em espaços não-convencionais, ou seja, fora da escola, tal como foi descrito em relação à educação religiosa dos católicos e dos protestantes em A Ética. A abrangência de sua abordagem o levou a considerar como agentes educativos os sacerdotes, os pais, os guerreiros, os filósofos, os literatos chineses, etc. Convém ressaltar que o autor também analisou a educação em espaços convencionais, na sua abordagem da educação dos literatos chineses e nos seus escritos sobre a universidade. Nestes, explicitou, inclusive, o comportamento ideal do docente, enfatizando que a universidade não é o lugar adequado para esse profissional expor seus pontos de vista. Segundo ele, a atribuição destes pressupunha apenas o reconhecimento dos fatos, mesmo os que fossem desagradáveis. Na esfera pedagógica, o professor não devia fazer julgamentos. Dessa forma, Weber acreditava ser possível evitar que os preconceitos tomassem conta da formação dos alunos.
Partilho da avaliação de Lerena (1983) e de King (1980) ao afirmar que os sociólogos da educação têm uma dívida com Weber por não considerarem que ele possui a mesma importância que os outros clássicos da Sociologia. A seguir destacarei alguns aspectos analisados pelos referidos autores que ilustram essa afirmação.
Para Lerena (1983), a dívida que os sociólogos da educação têm com Weber refere-se ao fato de suas reflexões não serem incluídas no âmbito de sua Sociologia da cultura. Conforme mencionei anteriormente, partilho dessa interpretação do autor ao considerar que Weber procurou compreender o significado característico da cultura ocidental([1]) e que as suas reflexões sobre a educação se inserem nessa temática. Cultura e educação são analisadas por Weber como mecanismos que contribuem para manutenção de uma situação de dominação – seja mediante o costume, a dominação tradicional, o aparato racional-legal, a dominação burocrática, ou pela influência pessoal, dominação carismática. Em síntese, concordo com a explicação de Lerena (1983) ao considerar que as formulações de Weber sobre a educação não são meras alusões genéricas ao tema e, sim, constituem-se em ilustrações de uma teoria da educação, e essa se relaciona com a sua Sociologia da Cultura e com sua Sociologia da Política.
O enfoque dado por Ronald King (1980) sobre a importância da teoria sociológica de Weber em estudos sobre a educação, tanto no que se refere à pertinência de utilizá-la em sua perspetiva micro como também em sua perspectiva macro, complementa, a meu ver, a interpretação de Lerena (1983). Em relação à primeira dimensão, King (1980) destaca as contribuições de Weber sobre os tipos de autoridadee os tipos de educação. Mas, é valendo-se da conexão dessa perspectiva micro de análise com a perspectiva macro – principalmente o método comparativo utilizado por Weber – que King destaca a pertinência da utilização deste autor em estudos sobre a educação. Ressalta que os tipos-ideais de educação discriminados por Weber devem ser empregados em consonância com o método de análise do autor – com propósitos comparativos.
King reconhece que a grande contribuição da Sociologia Compreensiva está em negar as explicações totalizantes da realidade, ou seja, a realidade individual adquire significado individual. A adoção dessa perspectiva de análise em estudos sobre a educação é muito relevante por possibilitar a abordagem das intenções subjetivas dos diferentes atores envolvidos no processo educativo, contudo, sem se ter a pretensão de esgotar a realidade. Isso porque a realidade só é compreensível quando articulada com o significado subjetivo atribuído pelos indivíduos. Dessa forma, King valorizou explicitamente o individualismo metodológico proposto por Weber e a importância das idéias na causalidade social.
([1]) O próprio Weber explicitou o seu interesse nesse campo de trabalho na Revista Archiv fur Soziawissenschaft und Sozialpolitik ao mencionar que as suas formulações teóricas dizem respeito à “exportação científica do significado cultural da estrutura sócio-econômica da vida comunitária bem como sua forma de organização histórica” (WEBER, 1971, p.23).
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