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O Ano Mil
(Hilario Franco Jr)

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Apostando nas semelhanças psicológicas e emocionais entre o homem da virada do último milênio e aquele que assistiu à chegada no ano 1.000, o autor procura resgatar a mentalidade da época a partir de três diferentes óticas culturais: a dos clérigos, dos leigos e àquela que instituiu chamar de " intermediária" - ao mesmo tempo fusão e campo de síntese entre as duas primeiras.

Franco Júnior abre o seu "Ano 1.000" com um breve histórico e análise da concepção de tempo no mundo medieval - principalmente no que se refere aos cômputos adotados pela Igreja Cristã. O autor reafirma o caráter do tempo enquanto realidade psicológica - realidade esta que, ao longo de toda a obra, será apresentada como ferramenta ideológica de suma importância, não apenas para os povos do ocidente, mas para a grande maioria das formações sociais.

Visitando algumas das principais polêmicas teóricas sobre a existência ou não de um medo coletivo às vésperas do ano 1.000 - causadas por deficiências de cunho documental, conceitual e metodológico, mas sobretudo pelo fato de que as fontes disponíveis foram, nas sua maioria, produtos da classe clerical - Franco Júnior conclui que:

"Deve-se ir além da mensagem consciente e premeditada de seus autores, para se chegar ao implícito, aos silêncios, aos atos falhos, àquilo que está dito à revelia do eclesiástico. Somente uma leitura documental desse tipo pode alcançar aquilo que não produto cultural de apenas um grupo e, sim expressão da sensibilidade coletiva"

Em prol de uma análise mais verdadeira das mentalidades que permearam o período, o autor propõe uma divisão trina do universo cultural: cultura clerical, cultura vulgar e cultura intermediária. Estes são, antes de mais nada " três olhares complementares", que permitirão um panorama mais completo da realidade medieval, quando: "a condição político-econômica da pessoa não alterava sua inserção cultural: mesmo um humilde pároco estava no âmbito da cultura clerical, mesmo um poderoso duque estava no da cultura vulgar".

A cultura clerical dizia respeito à classe eclesiástica - que, do ponto de vista oficial, era a classe letrada. Na cultura vulgar, ligada aos leigos, estava inserida a tradição oral. Já a cultura intermediária era onde ocorria a fusão das duas culturas anteriores - um universo que estava sobremaneira influenciado tanto pelo cristianismo douto quanto pelo cristianismo laico.

Tais categorias culturais foram influenciadas pela realidade social, política, religiosa e econômica do século X - mais precisamente, na opção do autor, o período compreendido entre os anos de 980 e 1040 - e dos séculos que o precederam. Assim, a desintegração do Império Carolíngio, as invasões de povos nórdicos e muçulmanos e o "domínio dos leigos" na Igreja Católica colaboraram para o surgimento de uma sensação geral de que algo estava errado. Do ponto de vista econômico o surgimento do feudalismo chocava não só pelo caráter bélico adotado pelos detentores de terras como, também, pelo ingresso dos cristãos em novas atividades econômicas - como o comércio - que eram mal vistas pela tradição cristã.
Particularmente com relação à cultura clerical, Hilário Franco Júnior observa que esta aceitava a idéia de um fim de mundo - mas resistia à determinação de um prazo para a realização desta promessa. Ainda que não refutasse a tradição de seis milênios para a duração do mundo - o que, a depender dos cálculos, colocaria o apocalipse em torno do ano 800 - , a Igreja viu prevalecer a mentalidade de Agostinho de que pregava ser impossível calcular-se o tempo divino.

O Apocalipse ou Juízo Final foi, assim, elevado à categoria de eterna ameaça, a pairar sobre a cabeça daqueles que caíssem em pecado. Franco Júnior ( p.40) observa que, embora não tivesse acesso às inúmeras traduções do texto de João, o público iletrado era inspirado pelas esculturas que tratavam do tema - ardilosamente, um pouco mais tarde, colocadas sobre os pórticos centrais das igrejas.

Para além das comparações da arca de Noé com a Igreja - enquanto únicos expedientes de salvação nos respectivos Juízos , passado e futuro - a figura do Anticristo surgiu de forma proeminente. Amálgama de tradições orientais, apocalípticas ou relacionadas ao Velho Testamento, ele encontrou reforço na cultura clerical através da menção de seu nome - ainda que com significado genérico - no texto bíblico.
Para a cultura vulgar - universo das tradições orais - o fim próximo parecia inevitável. Franco Júnior vê nesta mentalidade a resposta revoltada das camadas sociais mais populares à imposição dos valores sociais defendidos pela cultura oficial. Neste aspecto, a propostas de purificação das heresias é o exemplo mais contundente de que alterações promovidas pelo ingresso no modo de vida feudal desagradavam a parcela mais numerosa da população. Ao longo deste período contestação social e espiritual caminhavam juntas.

Muito antes de ser um castigo, o fim do mundo para a cultura intermediária era visto - na opinião do autor - como algo esperado. Ocorre que este "fim" seria o início de um era de mil anos, repleta de felicidade terrena para a humanidade.
E função de ser claramente um sintoma e, ao mesmo tempo, uma ferramenta de contestação, o milenarismo foi visto como algo negativo por parte do setor conservador da sociedade: a Igreja. Porém, Franco Júnior observa que nem ela conseguiu ficar imune ao seu fascínio.

FRANCO JÚNIOR, Hilário. O ano 1000. São Paulo: Companhia das Letras, 1999. (Virando séculos)



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