O uso do Habeas Corpus e a defesa da democracia
(MARCELO LEAL DE LIMA OLIVEIRA; THAÍS AROCA DATCHO LACAVA)
Recentemente foi apresentado no Senado um anteprojeto para um novo Código de Processo Penal. Nesse anteprojeto se quis limitar o cabimento da Habeas Corpus aos casos de ameaça direta ao direito de locomoção. A justificativa é o elevado número de Habeas Corpus que tramita pela justiça brasileira, alegadamente travando o funcionamento do poder judiciário. Pela proposta, casos como coação ilegal resultante de falta de justa causa, a incompetência do juízo, a nulidade do processo, ou a extinção da punibilidade, hoje pacíficas no nosso ordenamento, seriam extirpadas, com evidente prejuízo à liberdade. Felizmente, a proposta foi recusada nesse particular e foi mantida a redação tal qual se tem hoje. Queriam acabar com um remédio constituicional importante demais. Foi algo conseguido à duras penas, à custa de vidas humanas! Tanto que é chamado de remédio heróico! Não poderia ser assim destroçado! A propósito, o aumento de Habeas Corpus, se é que existe, decorre exclusivamente do aumento de ilegalidades pelos órgãos do poder estatal. Pontes de Miranda, um dos gigantes do mundo jurídico brasileiro, certa feita disse sobre o remédio heróico: "O ‘habeas corpus’ foi um dos passos mais seguros e uma das armas mais eficientes para a salvação da civilização ocidental. É o ‘não’, que a Justiça diz, em mandamento, à violência e à ilegalidade; e o ‘sim’, a quem confia nos textos constitucionais e nas leis. Mesmo aqueles povos que avançaram, ou que avançam, com revoluções, para a maior igualdade, têm, com o tempo, de atender a que para o Homem há três caminhos que o elevam no futuro: a democracia, a liberdade e a maior igualdade". O Habeas Corpus surgiu com a Magna Carta, de 1215, Inglaterra e é o maior instrumento constitucional à disposição do cidadão para que este possa se voltar contra os abusos do Leviatã estatal. No Brasil de hoje, onde temos um Estado cada vez mais invasivo, policial e dado a abusos de toda sorte, nada mais essencial do que manter intacto esse precioso instrumento de defesa das liberdades do cidadão. Costuma-se, como em tudo, colocar a culpa nos advogados, que abusariam do instrumento. Mas uma estatística importante prova o contrário: 23% dos Habeas Corpus que chegam ao Supremo Tribunal Federal são cartas escritas de próprio punho pelos cidadãos presos em razão de ilegalidade e injustiça. Nas irretocáveis palavras dos autores: Restringir esta via é não apenas impedir o acesso à Justiça como calar a voz do povo e sufocar a esperança de democracia da nação".
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