O Que É O Virtual?
(Pierre Lévy)
A virtualização enquanto um momento de mutação do processo de hominização ? auto-criação da espécie humana, é o ponto de partida para o livro ?O que é o virtual??, do filósofo francês Pierre Lévy. O autor aborda o fenómeno da virtualização à luz da relação entre a comunicação virtual e as características da sociedade contemporânea. A reflexão centra-se numa tripla abordagem (definida por Lévy como o triplo interesse do livro): filosófica (o conceito de virtual e o movimento da virtualização), antropológica (o processo de hominização que nasce com a virtualização) e sociopolítica (a mutação contemporânea que nos torna actores de uma realidade acelerada). A hipótese que Pierre Lévy equaciona, a propósito do processo de virtualização, opõe-se à ideia de ?desaparecimento universal? (Idem, ibidem) vaticinada por Jean Baudrillard ou à ?ameaça de um apocalipse cultural? (Idem, ibidem) anunciada por Paul Virilio. A proposta de Lévy centra-se na comunicação virtual enquanto elemento de um processo que abrange toda a vida social, sublinhando aspectos como a diferenciação entre o virtual e o real, a dimensão económica da comunicação, a desterritorialização e a problemática da temporalidade associada ao movimento de virtualização. Pierre Lévy defende que o virtual não se opõe ao real. O autor postula uma desmistificação dos opostos, enunciando duas dialécticas: possível/real e virtual/actual. Estes quatro conceitos existem nos domínios do latente e do manifesto, o que remete para as noções de subjectividade e de objectividade ? o latente anuncia o devir, o manifesto situa-se na esfera da objectivação, da concretização. No âmbito das dialécticas possível/real e virtual/actual, Pierre Lévy invoca estas quatro formas de existir para definir duas ordens: a da selecção e a da criação ? que correspondem aos pares possível/real e virtual/actual, respectivamente. A tese de Lévy sustenta que o possível se caracteriza por ser um conjunto de possibilidades pré-determinadas, a que falta existência. O processo de realização remete o conceito de possível, que se situa no âmbito do latente, para a noção de real, que se define como algo concreto (a concretização) no pólo do manifesto. Segundo o autor, o virtual é mediado ou potenciado pelas tecnologias, sendo produto de exteriorização de construções mentais em espaços de interacção cibernéticos. Neste sentido, o virtual não remete para operações puramente lógicas. É interpretado por Lévy como uma maneira de ser diferente do possível e do real, ?é o que existe em potência e não em acto? (Idem: 15). A actualização, que se assume como o movimento inverso à virtualização, parte de um problema ? o virtual, para uma solução. Esta transformação é ?a invenção de uma solução exigida por um complexo programático? (Idem: 17). O actual objectiva o virtual, situando-se no pólo do manifesto. O virtual, enquanto algo que existe em potência, anuncia o devir e insere-se no domínio do latente. As dialécticas postuladas por Lévy remetem para quatro passagens/transformações: realização, potenciação, actualização e virtualização. Cada um destes processos centra-se na ideia de ciclo: o possível (o pré-definido) concretiza-se no real (realização), esta operação dá origem a uma consequente potenciação (novo conjunto de possibilidades); o virtual (o problema) passa a actual quando é solucionado (actualização), potenciando em seguida uma nova virtualização ? passa de uma dada solução a um (outro) problema. A ideia de virtual enquanto potência pode remeter para a noção de ilusão, mas o autor sublinha que este elemento não se situa no domínio do onírico: ?a virtualização é um dos principais vectores de criação da realidade? (Idem: 18). Neste sentido, o virtual existe e produz efeitos. Logo, o movimento de virtualização implica irreversibilidade nos seus efeitos, indeterminação no seu processo e invenção/criação do seu espaço. Será, então, a virtualização um fenómeno da contemporaneidade? Lévy considera que, pelo contrário, antes das tecnologias electrónicas (dos dispositivos tecnológicos), já existiam vectores de virtualização, como a imaginação, a memória, o conhecimento e a religião.
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